Passaporte Português: “É preciso voar” para agarrar oportunidades

Entrevista

24-07-2023

# tags: Agências , Eventos , Passaporte Português

João Soares é diretor comercial da The Happiness Factory, “uma empresa que organiza eventos de A a Z”, com sede em Riade, capital da Arábia Saudita.

Nunca pensou ser emigrante, mas confessa que só regressará “de vez” a Portugal “quando já estiver com a sensação de dever cumprido”, sem “mais nada a acrescentar internacionalmente”. A trabalhar na Arábia Saudita desde fevereiro deste ano, João Soares refere que a principal barreira é, sem dúvida, a linguística. Não fala o idioma e a equipa que lidera é toda árabe.

Também “não tem sido fácil” estar longe da família, mas o português de Leça da Palmeira apresenta-se ao mundo como “um cidadão global” proativo e altamente motivado e orientado para os objetivos pessoais e profissionais que traçou quando aceitou o desafio de se mudar para a Arábia Saudita.

Sempre online a fazer networking na área dos eventos


Licenciado em Animação Cultural no Instituto Politécnico de Viseu e com uma Pós-Graduação em Gestão Artística e Cultural no Instituto Politécnico de Viana do Castelo, João Soares começou, “desde cedo”, a querer criar os seus “próprios projetos”.

O percurso profissional passou por vários pontos do país e João Soares começou a trabalhar como freelancer de programação para vários festivais em Portugal e em Espanha. Criou “uma companhia de teatro do zero e um festival de teatro.”

Durante a pandemia de covid-19, decidiu investir o tempo na criação de mais contactos internacionais. “Foi muita conexão, muita rede” e João Soares estava sempre online, com especial foco no mercado de eventos da Arábia Saudita.

“Foram os anos de maior mudança na minha vida. Durante esse período, foi quando alarguei a minha rede de uma forma mais rápida e eficaz, pois o setor estava todo online e com vontade de fazer eventos físicos, pelo que assim que surgiu a oportunidade. Estava na melhor posição possível”, recorda.

A evolução da pandemia esteve quase a prejudicar os planos, mas acabou por conseguir ficar em Riade, na The Happiness Factory. “Para mim, a covid foi uma oportunidade, mas foi uma oportunidade pela qual eu também lutei bastante”, sublinha.

Hoje, João Soares continua “sempre conectado, à procura de uma pequena brecha de mercados que possam ser diferenciadores” e “a tentar explorar os mercados que ainda não têm competição”. E os resultados do seu “trabalho de pesquisa, de networking, de digital” têm dado frutos, uma vez que no período pós-pandemia a empresa conseguiu reforçar a faturação.

“Os budgets são muito grandes”


A The Happiness Factory candidata-se a projetos “que podem ser do Ministério da Cultura, do Ministério do Desporto; podem ser projetos a título individual, como, por exemplo, o Al-Nassr, que é a equipa do Cristiano Ronaldo”. Seja qual for o projeto, “os budgets são muito grandes” e bem diferentes dos que existem no mercado europeu.

“Desde fevereiro até à data de hoje, nós já fechámos contratos no valor de 20 milhões de euros e fizemos seis projetos”, explica. Segundo João Soares, na Arábia Saudita a realidade é de outro mundo e “o mercado está num crescente fantástico, com imensas oportunidades, imenso potencial”.

“Para já”, adianta, “o dinheiro não é um problema”, embora o português preveja que daqui a uns tempos “vai começar a ser”, porque vai aumentar a concorrência. “As empresas internacionais começam a vir para cá, porque percebem que, efetivamente, a Arábia Saudita está a crescer de uma forma muito rápida e com muitas oportunidades”, afirma.

Arriscar e acreditar que é sempre possível fazer mais e melhor


Olhando para trás, João Soares considera que o seu percurso profissional tem sido “ascendente, natural e fruto de bastante empenho ao longo dos anos”. Chegou ao patamar onde está hoje “com muito trabalho e acreditando sempre que pode fazer mais e melhor”.

A área dos eventos atrai o diretor comercial da The Happiness Factory pela sua “irreverência e, ao mesmo tempo, singularidade”. Permite-lhe contactar com pessoas dos mais diferentes setores que, “juntas, permitem a realização de grandes espetáculos e acontecimentos, tudo para que o público possa desfrutar”.

João Soares sente-se “bastante motivado para o futuro, uma vez que existem muitos mercados por explorar” e grandes eventos que gostava de adicionar ao currículo. Nunca teve “medo de arriscar” e pensa que, por esse motivo, “as coisas foram surgindo” na sua carreira.

Portugal “estagnado” na área do entretenimento


Mais de sete mil quilómetros separam Portugal da Arábia Saudita, mas, no que diz respeito à área dos eventos, o afastamento é ainda maior, na opinião de quem conhece os dois mercados.

Em Portugal, João Soares vê “um setor na área do entretenimento um pouco estagnado”. Além de os budgets serem muito diferentes, considera que “a cultura, a arte não é algo muito valorizado pelos nossos chefes de Estado”. “O povo precisa de arte, precisa de oportunidade para libertar um pouco do stress que ocorre no dia-a-dia”, sublinha, insistindo na ideia de que Portugal tem “algumas oportunidades”, mas “não tem grandes evoluções”. “Não há aspetos muito diferenciadores, porque também não há grandes investimentos”, lamenta.

Ainda assim, Portugal “tem festivais de música muito interessantes, festivais de teatro como, por exemplo, o Imaginarius”, ao qual João Soares já esteve ligado. O que falta aos portugueses, defende, é alargar horizontes. “Vejo Portugal como um país que não tem grandes oportunidades, mas é preciso voar. O mundo é muito grande, pode-se trabalhar de Portugal para todo o mundo.”

“Ser irreverente e acreditar no seu potencial”


Da área dos eventos ainda não conheceu nenhum português a trabalhar na Arábia Saudita, onde há “muita gente do Reino Unido e dos Estados Unidos”. João Soares considera que o facto de ser europeu acaba por ser uma mais-valia na empresa onde trabalha, a par da sua “vasta experiência” na área dos eventos que faz com que “seja considerado sempre em momentos de decisão”. “Capacidade de liderança, capacidade de improviso e humildade são caraterísticas que me fazem ser reconhecido dentro da organização”, acrescenta.

De dois em dois meses, João Soares regressa a Portugal, onde passa 15 dias. Sente-se “grato” por poder viajar e visitar a família, mas voltar de vez ainda não está nos planos. “O mercado estrangeiro é enorme, basicamente não trabalho para um país, mas, sim, para cinco continentes. Fora de Portugal a concorrência é bastante maior, mas também as chances de sucesso”, conclui.

E a quem pensa tentar a sorte no mercado de eventos internacional, João Soares deixa o conselho: “Ser irreverente e acreditar no seu potencial. É necessário muito trabalho e dedicação, mas, no final, sabem bem todos os feitos alcançados. Criar redes estratégicas e que permitam expansão. O não está sempre garantido, pelo que não custa tentar.”