Rita Costa: de país em país atrás dos grandes eventos

Entrevista

13-11-2024

# tags: Eventos , Passaporte Português

Rita Costa tem 39 anos, nasceu em Lisboa, mas desde que saiu de Portugal para fazer Erasmus em Milão que é, verdadeiramente, uma cidadã do mundo.

Com um passaporte cheio de carimbos de tantas viagens que faz, a arquiteta formada no Instituto Superior Técnico já morou em sete países e tem uma bagagem cheia de histórias – e de grandes eventos – para contar.

A mãe de Rita bem tentou que a família ficasse reunida, mas o pai, natural de Angola, incentivou-a a alargar horizontes e “a sair de Portugal”. “Sempre tive isso na cabeça”, conta à Event Point, explicando que após um ano de Erasmus “ficou o bichinho” e voltou a ir para fora no âmbito do Programa INOV Contacto.

Quis o destino que esta experiência fosse novamente em Milão e oito meses depois, quando regressou a Portugal, Rita sabia que não seria por muito tempo, dada a vontade de seguir viagem, uma vez mais. Para estar sempre pronta para partir, deixou a mala aberta no chão do quarto, que até acabou por se tornar na cama do cão. “Todos os dias dormia lá”.

Procurou trabalho em Angola e recebeu uma proposta, mas acabou por ser uma vez mais o pai a dar uma ajuda na decisão: “Por que é que não vais para o Brasil?”, perguntou-lhe. E Rita foi para o Rio de Janeiro, mesmo sem ter nenhum trabalho à espera no destino.

Um sonho tornado realidade no Rio de Janeiro


Com 27 anos, um gosto por urbanismo e uma grande vontade de trabalhar nos Jogos Olímpicos de 2016, Rita Costa chegou, alugou um apartamento, pegou na bicicleta da amiga com quem estava a partilhar casa e foi “porta a porta com um currículo na mão”. Conseguiu logo emprego, passados cinco dias, num gabinete de arquitetura.

Mas o que Rita queria fazer profissionalmente “eram coisas grandes”. Quatro anos depois, a oportunidade surgiu e, em setembro de 2015, assumiu o cargo de Venue Look Manager do Comité Organizador dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio 2016, ficando responsável pela “aplicação da identidade visual do evento, para o público e para as câmaras [de televisão]”.

E foi nessa altura que a vida de Rita “mudou”. “Foi uma experiência incrível, foi o pior trabalho que eu já tive na vida e foi também o melhor”, afirma. As suspeitas de corrupção na organização dos Jogos no Rio de Janeiro vieram a público no início da competição e Rita recorda que o escândalo acabou por afetar negativamente o trabalho de todas as equipas.

“O nosso fornecedor foi demitido depois da cerimónia de abertura e, enfim, houve várias coisas pelo meio. Foi muito difícil. Não tínhamos estrutura, não tínhamos material, não tínhamos instaladores e tive que aprender tudo sozinha. Foi muito duro, mas também foi o melhor trabalho graças ao espírito dos brasileiros”, explica.

“Estávamos até às três, quatro da manhã a fazer coisas para outras áreas funcionais, não dormíamos. Fiquei três meses enfiada no Maracanã, conheço os túneis todos”, acrescenta, sublinhando que este foi o “primeiro trabalho em eventos e foi incrível”.

No final dos Jogos Olímpicos, Rita arranjou um trabalho numa obra, voltando para a Arquitetura, mas permanecendo no Rio de Janeiro, cidade que considera ser a sua verdadeira “casa”. Mas nesse trabalho “não era feliz” e os grandes eventos continuavam na cabeça.

“Pronto, é isto, eu vou ser nómada”


Uma vez mais, as estrelas alinharam-se e, em 2018, surgiu a oportunidade de seguir para Glasgow, para trabalhar como Venue Look Officer no evento European Championships. “Quando aterrei no aeroporto de Glasgow eu percebi. Pronto, é isto, eu vou ser nómada”.

A arquiteta recorda-se mesmo de pensar: “Isto é fácil, eu vou voltar a fazer isto, esta não é a minha última ‘brincadeira’”. E de facto não foi. Quando esse evento terminou, fez uma visita rápida a Portugal para ver a família e arrancou para mais uma viagem, desta vez em lazer, com colegas de Glasgow, pelo Sudeste Asiático.

No regresso a Lisboa, ainda no aeroporto, sem acesso à internet há dois dias e sem trabalho no horizonte, Rita voltou a estar ‘online’ e um email com a pergunta ‘queres ir para Abu Dhabi?’ voltou a mudar-lhe o destino.

Dois dias depois, Rita estava a caminho, desta vez como Look Project Manager nos Special Olympics. Foram cinco meses de “trabalho duro”, sobretudo por “a realidade ser muito diferente”.

Enquanto ainda estava em Abu Dhabi, Rita foi fazendo entrevistas para o que viria a ser o trabalho e evento seguintes, em Londres, no circuito de Fórmula E, uma categoria de automobilismo organizada pela FIA – primeiro como Event Branding Manager e depois como Senior Branding Manager.

Foram meses intensos, a viajar pelos vários países envolvidos na competição. “Viaja-se três semanas, volta-se dois dias a casa, lava-se a roupa e vamos para outro país completamente diferente”, explica.

A Fórmula E foi um evento completamente inovador face aos anteriores. “É muito diferente fazer motosport do que fazer outro tipo de eventos”, tais como as competições de futebol, voleibol, BMX, bowling ou equitação que Rita já tinha no portefólio nessa altura.

“Para quem morou no Rio de Janeiro, já não tenho medo de nada”


Esta experiência foi, por isso, “a mais imersiva” e a que lhe deu mais “confiança”. Assim que terminou, Rita foi contactada por um ex-chefe com mais um desafio, noutro grande evento: “Mundial do Catar. ‘Bora!”.

Sem medos, Rita aterrou no Catar para trabalhar como Signage & Dressing Venue Manager no FIFA World Cup Qatar 2022. “Para quem morou no Rio de Janeiro, já não tenho medo de nada”, lembra-se de pensar.

Enquanto ainda estava neste trabalho, Rita já andava em entrevistas através do LinkedIn para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, onde acabou por trabalhar como Look Cluster Senior Project Manager, estando responsável por “todos os estádios de futebol”.

Na equipa tinha “oito portugueses e 110 brasileiros”. Os imprevistos surgem sempre em grandes eventos, mas nada que assustasse Rita Costa, que confessa dar-lhe jeito o desenrascanço típico dos portugueses.

Um galo de Barcelos e uma assadeira levam Portugal ao mundo


E depois de Paris? “O meu objetivo principal é trabalhar em Portugal para o Mundial 2030”, responde. Entretanto, o futuro mais imediato poderá passar por Miami, nos Estados Unidos, a propósito do Mundial 2026.

Regressar de vez a Portugal ainda não está nos planos. “Eu estou a chegar a um patamar em que tenho confiança nas minhas capacidades e em que eu sei que já estou no passo acima. E também porque não existe em Portugal um grande evento. Por isso é que eu quero este de 2030. Eu acho que nós nunca vamos ter uns Jogos Olímpicos em Portugal. Por mais que Lisboa seja incrível, não chega. É muito dinheiro”, justifica.

Por enquanto, a ‘casa’ de Rita é por onde passar, mas seja onde for, Portugal vai sempre na mala. “Sempre que chego a um país penduro o meu póster do Bob Marley e do Jimi Hendrix, compro uma plantinha, levo o meu galo de Barcelos. Uma coisa que eu tenho sempre é uma assadeira de chouriço. É um sucesso! Não posso ir a uma festa sem levar a assadeira. E fazer bolo do caco com manteiga de alho. É sucesso garantido!”, remata.