2º aniversário do Altice Forum Braga: O caminho da retoma tem de ser feito em conjunto
11-09-2020
E as conclusões, apesar das diferentes perspetivas, parecem indicar que é necessário dar, ao turismo de negócios, a atenção que este merece, não só na definição de regras, mas também em relação às suas especificidades.
A necessidade de trabalhar em conjunto na procura de soluções e as mudanças trazidas pela pandemia também fizeram parte de uma conversa que parece ter reforçado a ideia de que a tecnologia não matou os eventos presenciais.
Na sessão de abertura, Ricardo Rio, presidente da Câmara Municipal de Braga e da InvestBraga, fez um breve resumo histórico do espaço, lembrando o impacto que tem tido na região. “Hoje em dia temos mais visitantes ao centro de rastreio aqui instalado do que aos eventos que foram sendo promovidos”, lamentou o autarca.
Deixou, no entanto, uma mensagem de confiança, dizendo que “não tem que continuar a ser assim” e mostrando-se convicto que com um trabalho conjunto entre entidades de saúde e os intervenientes no setor do turismo “é possível promover essa retoma”.
Ricardo Rio
Estava assim lançado o mote para a discussão. Lídia Monteiro diretora coordenadora da Direção de Apoio à Venda do Turismo de Portugal (TP), que fez a intervenção seguinte, afirmou categoricamente que “é possível fazer eventos num momento de pandemia”.
A responsável do TP começou, porém, por assinalar o facto de as comemorações decorrerem “num momento difícil para o turismo e para este setor”: “Estar presencialmente numa sessão é um momento emocionante, pelo caminho longo que fizemos enquanto sociedade e setor para termos condições de estar numa sessão presencial e desenvolver atividade na área do turismo de negócios”.
A trilogia da retoma, segundo o Turismo de Portugal
Já no que respeita à retoma, indicou que a realização de eventos tem de ser feita de acordo com “aquilo que as empresas precisam, o que a procura impõe e o que as circunstâncias admitem”.
Assim, e entre o que considera serem os cinco fatores para a recuperação e futuro, referiu os mecanismos já existentes, como o Selo Clean & Safe ou o despacho 7900/2020 (que fixa os princípios e orientações aplicáveis à realização de eventos corporativos) como elementos geradores de confiança.
Para contrariar a retração da procura é também necessário, na sua opinião, trabalhar para repor ligações aéreas, embora este trabalho seja feito “num contexto volátil que exige monitorização diária”. Ainda assim, o nível de recuperação de ligações aéreas foi, segundo a diretora coordenadora do TP, de 30% em julho e 47% em agosto. Prevê-se que sejam atingidos os 57% em setembro e 64% outubro.
Lídia Monteiro
A centralidade no cliente e manter contactos com decisores e com trade, bem como ações comerciais e promocionais são, na sua opinião, formas importantes de promover a retoma.
A responsável falou também nas linhas de apoio do TP - a grandes eventos e a eventos com interesse turístico – que estão a ser criadas, lembrando igualmente o apoio direto à tesouraria.
A “inadiável digitalização do setor” é outro fator determinante para a retoma. “As empresas e marcas estão a mudar e quem estiver mais apto terá mais oportunidades”, sublinhou, destacando que, nos eventos “a coexistência entre o digital e o humano é uma tecnologia cada vez mais afinada e disponível”.
A sustentabilidade é outro fator fundamental. Lídia Monteiro citou mesmo o secretário-geral da ONU, António Guterres, que lembrou que “a ameaça climática é muito mais grave do que a pandemia” para reforçar a importância de eventos mais sustentáveis.
Por último, referiu como fator essencial a experiência vivida pelos participantes em eventos. “A força de atração dos eventos reside na partilha de conhecimento, na promoção do networking e na valorização pessoal e profissional. São espaços de formação, descoberta, difusão de novidades e transformação da sociedade. São janelas de conhecimento que não podemos deixar que se fechem. Mas, por mais sofisticada que seja a via digital não substitui a experiência de estarmos juntos”.
A sua última mensagem foi quase um desafio: “É importante trabalharmos em conjunto”.
Pensar e agir coletivamente
Uma mensagem que, curiosamente, foi um dos pontos fortes do primeiro painel de discussão. Sob o tema “ O novo normal. Perante os atuais desafios, os eventos híbridos são apenas uma das novas faces no dia-a-dia dos organizadores de congressos”, Pedro Cardoso, fundador da The House of Events, Cristina Gouveia, diretora Citur e Vasco Noronha, fundador da Factor Chave, partilharam a sua experiência de trabalho no atual contexto e as perspetivas para os próximos tempos.
“Pensar e agir coletivamente, para mim, é o novo normal”, disse, a certa altura, Pedro Cardoso, referindo-se à forma como, depois de um adiamento, resolveu avançar para a realização do Congresso de Medicina Interna, que decorreu naquele mesmo espaço.
Destacando a coragem da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna em decidir realizar o evento, recordou que “o momento para uma retoma foi enquadrado de uma forma relativamente tranquila”.
“O trabalho foi juntar à nossa volta as melhores cabeças, reunir todos os envolvidos e ver quais as melhores soluções para resolver os problemas dentro do quadro que existia”, contou. Na sua opinião, a pandemia trouxe “um espírito muito mais aberto” e maior disponibilidade para “aprender e colaborar”.
Vasco Noronha, Cristina Gouveia, Rui Ochôa e Pedro Cardoso
Uma opinião em parte partilhada por Cristina Gouveia, diretora Citur, que, embora admitindo que os últimos meses não têm sido fáceis “devido à falta de confiança no destino e no que pode acontecer”, sublinhou: “Com a vontade e ajuda de todos os parceiros e fornecedores é possível que determinadas coisas sejam feitas. Estamos todos do mesmo lado e havendo boa vontade é possível”.
Vasco Noronha viria também a expressar uma visão semelhante: “[a pandemia] Uniu mais as pessoas, demonstrou que são importantes boas parcerias, que temos de estar preparados para ceder um pouco e encontrar a melhor solução para todos os intervenientes no processo”.
Já no que respeita à retoma, Cristina Gouveia admitiu que, no caso específico da Citur, a situação pode ser mais difícil, não só porque “não há pedidos novos” como é “complicado programar o que quer que seja” a médio e longo prazo quando a situação epidemiológica e as próprias regras vão sofrendo alterações. “Um incentivo é um evento de pessoas, de experiências e só estando cá se consegue ter essas experiências”, frisou.
Vasco Noronha falou sobre a transformação dos Encontros de Primavera num evento digital. Este evento na área da Oncologia, que costuma reunir anualmente cerca de mil pessoas, estava marcado para abril, mas foi adiado para junho, mas cedo se percebeu que a reunião não poderia ser feita em modo presencial.
A solução, foi, por isso, avançar para uma edição digital e, mais uma vez, a comunicação e a entreajuda entre parceiros foi fundamental. “O segredo é ter os parceiros certos e falar com eles. As pessoas querem que as coisas continuem a acontecer e cerca de 90% dos patrocinadores disseram que iam continuar a apoiar”, revelou. Apesar do sucesso, com 1100 inscritos e 400 pessoas online em simultâneo em certos momentos, o responsável pela Factor Chave defende que “o networking não se consegue no modo virtual” e que será necessário “evoluir para um modelo híbrido”.
Terá sido a pandemia um acelerador de mudanças? Pedro Cardoso admitiu que trouxe “uma imensa energia e um despertar para um espirito de solidariedade e de consciência e necessidade de partilha” que não existia, tendo permitido também uma maior liberdade na gestão do tempo.
Já para Cristina Gouveia, e uma vez que “os eventos híbridos não resultam nos incentivos”, a pandemia trouxe, sobretudo, tempo para “repensar o negócio e como preparar o futuro quando voltar ao novo normal”. Assim, tem sido feito um trabalho de pesquisa e de preparação de programas diferentes, procurando também encontrar mercados alternativos e grupos mais pequenos e temáticos.
Vasco Noronha referiu o desafio de procurar novas soluções de sair da zona de conforto.
No fim do painel, uma intervenção no período de perguntas e respostas alertou para alguns problemas do setor. Gouveia dos Santos, diretor-executivo da AMTC, falou na falta de regulamentação, que, na sua opinião, tem prejudicado muito as empresas que trabalham na área.
Cristina Gouveia concordou que é necessário “empenho governamental e de decisores ao nível europeu”, enquanto Vasco Noronha admitiu que “é impossível programar a dois meses se as regras são alteradas de 15 em 15 dias”. Já Pedro Cardoso disse que também é responsabilidade do setor “contrariar este estado de coisas”, avançando com propostas e não ficar à espera que se definam as regras.
Um setor diferente, mas a que não se pode ser indiferente
O painel seguinte, “Desafios da retoma. Como encaram os destinos os novos tempos que o mundo inteiro vive, contou com as intervenções de Luís Pedro Martins, Presidente do Turismo Porto e Norte, Vítor Costa, Presidente da Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa e João Fernandes, Presidente da Região de Turismo do Algarve, que participou remotamente.
O presidente Turismo Porto e Norte falou sobre a estratégia da entidade a que preside e lamentou algumas limitações à retoma, como a política fiscal – considera que o IVA “não cativa a realização de eventos” – as diferenças de orçamento em relação a entidades concorrentes estrangeiras ou a escassez de diretrizes a nível internacional.
Já Vítor Costa lembrou que, com a crise no turismo, incluindo no turismo de negócios, “é posta em causa a subsistência da estrutura económica” composta não só pelo turismo, mas por todos os setores que dele dependem.
“É um setor que tem de ser olhado de forma diferente”, ressalvou, dando como exemplo um hotel. Se este entrar em dificuldades, pode ser adquirido por outro grupo e mantem-se em funcionamento. Mas no caso de equipamentos e serviços ligados ao turismo, e mais concretamente no turismo de negócios, tudo é diferente. “No caso de falência de um grande equipamento, este não é substituído. No caso de um PCO ou DMC, se essa entidade desaparecer não é substituída. O prestígio, a ligação a uma determinada pessoa e a confiança são fundamentais”, disse.
Vítor Costa, Rui Ochôa, Luís Pedro Nunes, e João Fernandes (remotamente)
“O primeiro desafio é manter a estrutura económica do turismo, que não é igual em todas as atividades económicas. Há um reconhecimento que tem de ser feito desta especificidade”, considerou, alertando para a necessidade de “medidas e um programa específico para o turismo”.
João Fernandes referiu a importância da confiança e da promoção internacional da imagem de segurança. “Sermos transparentes na forma como difundimos a informação sobre a situação epidemiológica é um dos fatores de construção de confiança no destino”, considerou.
“Enquanto vivermos na contingência de uma pandemia podemos trabalhar na construção coletiva na confiança”, afirmou, destacando “a capacidade de pensar e agir coletivamente”.
Luís Pedro Martins recordou que, na fase de desconfinamento, um dos setores que menos preocupações levantava “era justamente o turismo de negócios, pela sua capacidade de organização, facilidade de criação de parcerias”. “Por isso ninguém compreende porque se avalia da mesma forma o que é diferente. É urgente uma avaliação por parte da DGS”, alertou.
Assim, será necessário repensar mecanismos de captação de eventos?
O responsável pelo Turismo Porto e Norte considerou importante que uma linha de apoio não se esgote num evento e disse “acreditar que estas verbas avultadas que vão chegar [da União Europeia] tenham em consideração este setor”.
“É um setor com capacidade de arrastamento e, quanto mais depressa recuperar, mais depressa outros vão recuperar”, afirmou, pedindo uma discriminação positiva não só para uma região, mas para todo o setor.
João Fernandes lembrou a importância do turismo na economia nacional, até porque na balança entre importações e exportações não é deficitário: “Não tenho dúvidas que quem vai fazer sair desta crise será o turismo”, garantiu. “Há que diversificar a oferta, atrair público para um território mais vasto. Não temos turismo a mais, temos é outros setores a menos”.
Um olhar internacional e um estudo para fazer pensar
Sjoerd Weikamp, editor da Event Branche, revista holandesa dedicada aos eventos, foi o convidado internacional da conferência. O orador partilhou com a audiência que o setor na Holanda vive momentos complicados: "Há um pacote de ajuda do governo, que foi estendido no tempo, até março de 2021". Lá, como cá, várias empresas de eventos enveredaram pelos eventos online, havendo, neste momento, ainda poucas iniciativas presenciais. "Em termos do live, o corporate, as marcas, as instituições que sabem que os eventos são os momentos mais poderosos em termos de comunicação e marketing pensam: as pessoas estão a trabalhar de casa, não vamos fazer eventos", lamenta. Na Holanda é possível fazer eventos, desde que com regras apertadas de distanciamento, "mas quase não se vê marcas a arriscarem".
Sjoerd Weikamp
Sjoerd partilhou em primeira mão os resultados de um estudo neurocientífico realizado pela sua editora, que decorreu em janeiro e fevereiro deste ano. "Através de uma ferramenta neurocientífica, conseguimos analisar a parte da frente do cérebro durante um evento presencial", no caso específico uma feira, conta. "Demos a 30 pessoas a mesma 'sales pitch', em três stands diferentes, e mediu-se emoções, mas também os factos e números que eram dados, procurando saber o que o cérebro faz com essa informação. Depois a outro grupo de pessoas mostramos o mesmo pitch em vídeo.
Ficou claramente provado que, especialmente em relação aos factos e números, o cérebro investe mais na mensagem durante os momentos live do que quando transmitimos o mesmo conteúdo via vídeo". Para o editor, "esta é a prova da importância da nossa indústria, de que o live é mais eficaz".
Quanto ao futuro imediato da indústria, a opção são os eventos mais pequenos. E as empresas de eventos têm de demonstrar que estes podem ser realizados.
Olga Teixeira
Cláudia Coutinho de Sousa