Álvaro Covões: “Tudo é possível fazer‑se desde que se cumpram as regras”
18-12-2020
As Noites do Palácio levaram aos jardins do Palácio de Cristal, no Porto, António Zambujo, The Black Mamba, HMB, Gisela João, Jorge Palma, Diogo Piçarra, Blind Zero e Rui Veloso. Um cartaz apetecível, um público com saudades de espetáculos ao vivo e um cenário especial criaram as condições para que “as comemorações do regresso à normalidade”, como anunciava a autarquia, tivessem sido um sucesso.
Um regresso à normalidade que, como se adivinha, cria para os promotores de espetáculos novos limites e desafios. Ultrapassados neste caso, deixando boas indicações para outros eventos.
Para Álvaro Covões, diretor‑geral da Everything is New (EIN), “o grande desafio neste e em todos os eventos é garantir o cumprimento de todas as regras de segurança para retomar a confiança do consumidor”.
Confiança parece ser mesmo a palavra de ordem para a retoma dos eventos e, lembra o responsável, “no caso dos espetáculos é muito importante”. “As autoridades de saúde têm definido um conjunto de regras e todas as áreas económicas têm‑se esforçado no seu estrito cumprimento, para ganharem a confiança dos consumidores para os seus serviços”, recorda. Conquistar a confiança passa, assim, pela implementação dessas regras, para que o público se sinta seguro e compareça.
Regras cumpridas e espetadores conscientes de qual o seu papel nesta nova realidade têm sido uma constante nos eventos que organizou nos últimos meses. Álvaro Covões diz que as coisas têm corrido bem, mesmo nos aspetos que poderiam parecer mais complexos: “Um dos temas mais sensíveis e que tem funcionado muito bem é a forma como controlamos a entrada das pessoas e fundamentalmente a saída. Porque à entrada as pessoas vão chegando aos poucos e à saída querem sair todos ao mesmo tempo. De facto, temos conseguido, obviamente que com a colaboração dos espetadores. As pessoas ficam sentadas e vão seguindo as indicações das nossas equipas para irem saindo ordenadamente e com afastamento necessário para garantir as regras de segurança. Isso foi talvez a experiência mais positiva de todos os eventos que fizemos na era Covid”, salienta.
O respeito pelas regras e o cumprimento das indicações dadas não surpreendem o responsável pela EIN: “Somos um povo inteligente e sabemos que, se queremos continuar a viver como vivíamos, temos de cumprir as regras e temos de ultrapassar esta crise”. A forma como têm sido respeitadas as indicações para a utilização de máscaras em espaços fechados é um dos exemplos que aponta para ilustrar esse cumprimento.
Uma experiência engraçada
“As Noites do Palácio foram uma experiência muito engraçada”, diz Álvaro Covões, salientando um conjunto de fatores que contribuíram para a singularidade do evento, como a beleza dos jardins do Palácio de Cristal, o enquadramento dado pela Super Bock Arena e o facto de terem estado presentes grandes nomes da música portuguesa.
“Esgotámos os espetáculos todos. Não era muito grande, eram 650 lugares e não tivemos dificuldade em vender os bilhetes”, lembra, admitindo que “as pessoas também têm uma necessidade de sentir a música ao vivo, porque é uma experiência completamente diferente e enriquecedora”.
Além disso, diz, “o homem é um animal social” e, por isso, as celebrações familiares, as saídas com os amigos e as festas e encontros das empresas são momentos de que todos têm sentido falta.
E, mais uma vez, a palavra confiança surge na conversa. Porque ela é fundamental nesta fase. E existe, garante Álvaro Covões, “de uma forma geral, não só nos espetáculos, mas na restauração, na hotelaria, no comércio e até nos transportes públicos”. É importante “as pessoas perceberem que as regras existem e desde que se cumpram podemos ter uma vida melhor”, salienta.
A prova dessa confiança é a forma como “o turismo interno foi fundamental” para que o país sentisse alguma retoma no verão. “Não foi o suficiente, obviamente, para a oferta que temos, mas foi fundamental para dar uma lufada de ar fresco numa indústria que estava parada”, destaca.
Em casos como as Noites do Palácio, em que os espetáculos decorreram ao ar livre, serão as regras mais fáceis de cumprir? E como reagirá o setor – e o público – durante o outono e o inverno? O promotor, que tem agendados concertos para salas como o Coliseu de Lisboa e o Altice Arena, não receia a chegada do tempo mais frio. “Há regras para espaços fechados e têm acontecido muitos eventos. Aquilo que se tem conseguido com as regras que estão implementadas é que, quando vamos a uma sala de espetáculos, cruzamo‑nos com três ou quatro pessoas, quase o mesmo ou menos do que ao ir ao supermercado”.
A organização das entradas e saídas, a inexistência de intervalos e o facto de não existir circulação de pessoas dentro da sala são exemplos de normas que fazem com que os espetadores se sintam seguros. Já para os organizadores, e devido à reduzida lotação das salas, a solução pode passar por fazer dois espetáculos por dia ou em mais dias, dividindo assim o público.
Álvaro Covões recorda que, a 1 de junho, a retoma foi assinalada com “Deixem o Pimba em Paz”, no Campo Pequeno. Seguiram‑se Dino D’Santiago e Orquestra Filarmónica Portuguesa. “Houve uma procura de acordo com a expetativa. Tem sido positivo. As pessoas que vieram sentiram‑se seguras e os que vinham com receio perceberam, quando chegaram, que tudo estava organizado para que a sua segurança não fosse comprometida e saíram super‑satisfeitos”.
Na altura, uma televisão francesa quis acompanhar o primeiro espetáculo da era pós‑Covid. “A ideia deles era que isto poderia ser um perigo, e perceberam, porque mostrámos tudo e deixámos que circulassem à vontade e que falassem com o público, que as pessoas mal se cruzavam umas com as outras. Vieram, sentaram‑se e saíram sempre em segurança”, recorda.
“Tudo é possível fazer‑se desde que se cumpram as regras. E as regras são definidas por quem sabe, que são as autoridades. Tudo se faz quando há organização e nós portugueses somos bons nisso”, elogia, lembrando que “o nosso crescimento no turismo também assenta nisso, na capacidade que os portugueses têm para organizar eventos, quer sejam culturais quer corporativos”.
“Temos uma capacidade fora do comum e isso ainda se realça mais porque conseguimos fazer melhor com poucos meios. Quando há muito dinheiro é fácil fazer, mas quando o orçamento é menor e se consegue ainda fazer melhor do que os outros fazem com orçamentos maiores, isso só é possível com uma capacidade de organização muito grande”, sublinha.
A mensagem para o setor
E, a propósito da notável capacidade do setor dos eventos, Álvaro Covões deixa um alerta fundamental para o presente, mas sobretudo para o futuro: “O que queremos é que isto se alargue também aos eventos corporativos, porque a minha perceção, o que eu tenho sentido no mercado, é que as empresas portuguesas, ao contrário do que seria expetável, estão a evitar eventos corporativos, como reuniões de direção alargadas, encontros de quadros… Na nossa economia, quando um começa a travar, trava o sistema todo”.
“Existem regras, existem empresas capazes e, portanto, não devíamos parar. Pelo contrário, acho que as empresas, principalmente os gestores, deviam dar o exemplo de apostar na economia portuguesa. Isso é fundamental, porque quando se está a travar, às vezes está a travar o crescimento da própria empresa”.
Na sua opinião, o que faz a diferença “é a decisão de fazer”. E se os espetáculos estão a ser feitos, os eventos corporativos devem também avançar, mas só o farão se os responsáveis tomarem essa decisão. “É o gestor de uma empresa que toma essa decisão e ao fazê‑lo vai contribuir para que o setor tenha trabalho ‑ o que é muito importante ‑ e se mantenha vivo, porque vai ser necessário e vai ser dos setores mais importantes para a retoma. Quando voltarmos à normalidade vamos precisar de todos esses profissionais”.
Enquanto gestor, sabe a importância destes encontros: “As empresas têm necessidade de estar em formação constante e esses eventos corporativos são muitas vezes para troca de impressões e de ideias, para trazer mais‑valia para a empresa e não só para o convívio. Se não só se fazia a festa de Natal”.
“Existem regras e com regras conseguimos garantir a segurança de todos. Então, porquê parar? Não vamos parar o nosso país, porque estamos a comprometer o nosso próprio futuro e o futuro da nossa própria empresa”, conclui.
Ficha do evento
Evento: Noites do Palácio
Data: 31 de julho a 22 de agosto
Descrição: Oito concertos durante quatro fins de semana
Promotores: Iniciativa da CM Porto, produzida pela Everything is New e PEV
Vídeo: https://fb.watch/2sgTluU5ml/
© Rui Ferreira
Olga Teixeira