Assumir papéis e protagonismo

14-04-2020

“É difícil neste momento falar do mercado de eventos pois os encontros foram proibidos, o movimento pelo isolamento social está cada vez mais forte e só serão confirmados os eventos do segundo semestre se a pandemia diminuir. Neste momento, estamos a pedir ao governo que garanta empregos”. A afirmação é de Toni Sando, presidente da Unedestinos e presidente executivo do São Paulo Convention & Visitors Bureau, que alega que de uma hora para outra uma situação inédita instaurou-se e abalou por completo o que conhecíamos como normalidade.

“Neste ponto, empregadores, empregados, desempregados, informais, MEIs [micro-empresas individuais], empresas, empresários, entidades, associações, sindicatos e poder público vivem um contexto que, inédito, não ofereceu tempo para planeamento ou reflexão; apenas para a ação. De modo a dar prioridadeao bem-estar, saúde e segurança, o poder público e os empresários passaram a direcionar os seus esforços para a manutenção de salários e empregos dos brasileiros”, afirma.

Num artigo publicado recentemente num meio de comunicação do setor, Toni Sando afirma que “é tempo de assumir papéis e protagonismo” para assegurar rendimentos e empregos. E ao mesmo tempo que o poder público deve tomar medidas de isolamento social, tem de criar medidas de “acesso a crédito, distribuição de renda aos mais necessitados, e assegurar serviços essenciais”.

Enquanto empresários e executivos se focam em defender os colaboradores, em criar condições para manutenção do trabalho, e adaptar seu produto ou serviço para os novos tempos, o mercado segue em compasso de espera, a aguardar que a situação em todo o mundo se estabilize. Entretanto, o que parece certo neste momento é que todos estão juntos, ainda que isolados, lutando pelo bem comum.

É preciso pensar na retoma

Embora estejamos ainda no olho do furacão, as empresas têm de olhar para o pós-crise e a organizar-se internamente para estarem prontas quando a retoma arrancar.

Na opinião de Elza Tsumori, presidente do ForEventos, entidade de articulação estratégica do setor de eventos, que reúne 18 entidades que representam mais de qual mil empresas, que geram mais de 5,1 milhões de empregos diretos e indiretos, “o setor está em isolamento social e isso significa para alguns que o ano de 2020 está perdido devido ao grande número de eventos cancelados ou adiados”.


Elza Tsumori


Em casa, a responsável admite que se há coisa que não tem existido é tédio, uma vez que todos os profissionais do setor estão à procura de soluções e alternativas para os próximos meses. Elza Tsumori acredita que se vai assistir à criação de eventos híbridos, com ambas as componentes virtul e presencial, mas isso vai levar a várias tentativas e erros até estar optimizado. “Espero mesmo é que a tecnologia possa ajudar o ser humano e a desenvolver o seu talento e criatividade para manter a cadeia de valor da indústria de eventos a seguir o seu caminho de desenvolvimento. Afinal, o evento leva cultura, entretenimento, educação, informação e fomenta o turismo, e vai ser um motor importante para a vida de todo os cidadãos quando tudo isso acabar” afirma Tsumori.

Da mesma opinião é Fabia Tanabe, coordenadora de Marketing da Huesker Brasil, que conta sua experiência como cliente. Fabia trabalha a partir de casa, interagindo com a equipa através de plataformas digitais e de contato telefónico.

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Fabia Tanabe
 

O encontro do marketing global da Huesker, que seria em abril na Alemanha, e que iria reunir todo o grupo, tinha sido adiado no início de março e agora foi definitivamente cancelado, informa.

A convenção da empresa que aconteceria no final de abril no Recife foi cancelada, mas, curiosamente, isso foi fruto de um apelo dos prestadores de serviços locais e não iniciativa da empresa. Contudo, para manter os objetivos de integração dos colaboradores, e de forma inédita, vão manter a parte do seminário e a abertura, com happy hour virtuais. “Estamos a montar a programação e vamos adaptar os conteúdos e garantir a tecnologia para transmissão”, afirma Tanabe.

Fabia Tanabe vê este momento como uma oportunidade de reinvenção e transformação em todos os setores. “Passados os primeiros impactos e com os corações mais calmos, é hora de fazermos do limão, uma bela e deliciosa limonada, e não deixar que a negatividade e o pessimismo tomem conta das nossas vidas. As empresas não podem parar, a equipa tem que estar alinhada, os conteúdos e o conhecimento têm de ser disseminados, todos precisam de estar unidos neste momento, para juntos sermos mais fortes, ainda que virtualmente.”

Sucedem-se, atualmente, todas as formas de comunicação virtual, mas nada substitui o aperto de mão e o evento presencial vai manter a sua importância.

Para Sueli Dias, da TLV, o momento é de incertezas e embora estejamos no mesmo barco mundial, haverá recuperação, mas as cicatrizes vão permanecer, bem como toda a aprendizagem.

“Em pouco tempo muitos eventos foram cancelados e associações como a AMPRO foram fundamentais para que o pânico não se instaurasse e tivéssemos uma avalanche de decisões precipitadas. Respiramos fundo e iniciamos uma Campanha ‘Não cancele, remarque’”. O tempo que agora existe à disposição pode ser usado para tarefas que estavam descuradas. “Temos de nos manter vivos, ativos junto ao cliente. Porque isso tudo vai passar e quando passar ele vai lembrar-se de quem nunca o esqueceu”, diz a responsável.

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Sueli Dias
 

Entre as alternativas encontradas pela empresa de Sueli estão a criação de Centrais de Atendimento totalmente em teletrabalho, com métricas iguais às presenciais; uso da Inteligência Artificial como meio de manter contactos, relacionamentos e pesquisa de disponibilidade de espaço para armazenamento e co-working para agências que precisam reduzir custos.

“Quando o movimento voltar não vai haver tempo de planeamento e quem não estiver preparado poderá perder oportunidades”, refere.

Na opinião do presidente da Ampro, Alexis Pagliarini, quando tudo isto acabar será o momento de criar um mercado mais ético e baseado em melhores práticas para clientes e fornecedores.

“Depois de atravessarmos juntos esta turbulência, será inevitável que o mercado reveja as suas relações de trabalho corporativo, tanto internamente, como em relação aos seus pares, concorrentes e os clientes. Não vai mais ser possível operarmos com prazos estabelecidos pelos clientes de 90 ou 120 dias para pagar aos fornecedores; a concorrência não pode ser especulativa e reunir uma imensa quantidade de agências e sem remuneração”, alerta.

É preciso que depois da tempestade venha a bonança de novas iniciativas, melhores práticas, atitudes mais dignas e coerentes dos gestores de eventos para que o mercado se recupere baseado em procedimentos mais éticos, abertos e transparentes.

“Se teremos de começar do zero, que seja para construir relacionamentos mais saudáveis, com práticas mais equitativas, amigáveis, boas e lucrativas para todos”, conclui.

Rose de Almeida
Foto de abertura: Toni Sando. Créditos da foto: Andre Stefano

Rose de Almeida é blogger e empreendedora do setor MICE. É meeting planner na CPL Meetings & Events. Mora em Lisboa e faz a ponte entre Portugal e Brasil promovendo conhecimento, relacionamento e negócios entre os dois países