Congresso da APAVT: resistência e regeneração

Reportagem

06-12-2021

# tags: Eventos , APAVT , Turismo

O reencontro do setor do turismo decorreu em Aveiro e juntou mais de 700 congressistas.

Sob o tema ‘Reencontro’, o 46º Congresso da APAVT – Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo reuniu 738 profissionais do setor no Centro de Congressos de Aveiro. O evento, que regressou ao formato presencial, ouviu especialistas em várias áreas, no sentido de auscultar o batimento do setor e o que se passa no país e no mundo.

Na cerimónia de encerramento, o presidente da APAVT lembrou os tempos difíceis que a pandemia trouxe ao setor. E, para Pedro Costa Ferreira, mesmo havendo a noção de que a velocidade da retoma não depende de fatores que se possam controlar, há, contudo, “a certeza de que podemos antecipar a retoma e aumentar a sua velocidade, com a clarificação e harmonização das restrições à mobilidade, a entrega de uma oferta flexível ao longo de toda a cadeia de valor, a resolução do problema de recursos humanos, o prolongamento de um quadro de apoio robusto e coerente, bem como uma renovada aposta na promoção externa, através do reforço das dotações financeiras”.

Segundo o responsável, “não é mais entendível, não é mais razoável, não é mais suportável que não se apliquem de imediato os apoios económicos às empresas e aos setores afetados”. E acrescentou: “Depois de 20 meses de crise pandémica, as empresas absolutamente fragilizadas, acumularam perdas e endividamento, não têm já a capacidade de resposta adequada. Ainda mais, se não existe clarificação constante das restrições anunciadas, aumentando a confusão, carregando a dúvida, gerando a incerteza.” O presidente da APAVT considera ainda que “defender a economia e as empresas não é ser-se materialista inconsciente”, mas “é cuidar do emprego” e, consequentemente, “cuidar da dignidade básica da pessoa humana”.

Para Pedro Costa Ferreira, “o apoio à retoma tem que continuar pelo menos até à Páscoa, o Apoiar.pt tem que ser reativado, pagando desde já o período de abril a dezembro deste ano e projetando ainda as consequências destas novas restrições agora implementadas”. E justificou: “Porque há gente que não tem mais onde se agarrar, mas que continua a trabalhar e a resistir. Essa gente são os agentes de viagens portugueses, que integram um setor que cresceu na última década” e que contribui “decisivamente para o crescimento da economia portuguesa, para a geração de emprego e para o equilíbrio das contas externas do país”.

“Essa gente, são os agentes de viagens portugueses que se uniram e vieram em força a este congresso gritar que não desmobilizam, que não desistem, que não se entregam”, os mesmos que “liderarão a recuperação do turismo português, e com ele a economia nacional, ao venderem este maravilhoso destino turístico pelos principais mercados emissores”, sublinhou. “Desistir desta força seria um crime económico dificilmente desculpável”, frisou ainda o responsável, que espera que o Governo “tenha a criatividade e a vontade necessárias de reforçar de imediato o apoio à economia e às empresas” e também que os políticos portugueses entreguem “uma solução política estável, que permita uma resposta global e efetiva à crise económica que foi reforçada pela crise política”.

 

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Rita Marques

 

“Este é um reencontro de muitos, mas é não de todos. Perdemos alguns”

A secretária de Estado do Turismo deixou algumas mensagens no encerramento do congresso. Rita Marques destacou primeiro o ‘reencontro’. “Gostava de sublinhar que este é um reencontro de muitos, mas não é de todos. Perdemos alguns”, afirmou, acrescentando ter sido feito um “esfoço coletivo e individual” de empresários e trabalhadores, mas, ainda assim, perderam-se algumas empresas, tendo em conta os “impactos brutais” da pandemia. “Portanto, este é um reencontro feliz, mas ao mesmo tempo também com alguma melancolia.”

Para Rita Marques, este reencontro foi, além de um grito contra o medo, um grito de alerta, de sobrevivência do setor. “O setor merece que continuemos a lutar”, referiu, garantindo que a luta pela manutenção do emprego vai continuar, tal como o apoio às empresas e o trabalho para garantir que o setor do turismo seja um motor importante para a retoma do país.

A secretária de Estado do Turismo acrescentou que este foi também “um momento de cicatrização e de alguma regeneração”. Adiantou ter gostado de ouvir alguns empresários com esperança para o futuro. “Cada cicatriz que temos é sempre uma prova de superação. E se há setor que tem muitas cicatrizes é este, mas também é verdade que cada uma delas é uma prova de superação…” Rita Marques terminou com uma nota de esperança, acreditando num próximo reencontro ainda mais generoso, com muitos participantes, algumas cicatrizes e muitas provas superadas.

O presidente da Entidade Regional Turismo Centro de Portugal, afirmou que este reencontro da APAVT contribuiu para a regeneração da confiança e da esperança. Pedro Machado referiu que o “processo de recuperação passa seguramente por voltarmos a olhar de outra forma para o mercado interno – Portugal redescobriu as suas valências, Portugal redescobriu as suas capacidades de poder gerar e de atrair cada vez mais”. E apontou outras dimensões em que é necessário continuar a trabalhar, como a do retorno do turismo internacional, a do apoio às empresas e a da sustentabilidade.

Por seu lado, o presidente da Câmara Municipal de Aveiro destacou duas palavras: compromisso e ponte. A primeira porque é necessário um compromisso de todos, incluindo dos políticos portugueses, já que, num novo cenário político que se avizinha, é necessário “um governo de compromisso”. Sobre a segunda, José Ribau Esteves deixou o desafio de construção permanente, “porque é nessas pontes entre nós que vamos lutar para servir bem os nossos cidadãos, os nossos clientes, para lutarmos pela nossa realização profissional, pela nossa felicidade e, no fundo, fazermos mais e melhor a cada dia pela nossa terra e pela nossa gente”.

 

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Pedro Siza Vieira

 

TAP é essencial também pela capacidade de atração de grandes eventos

Uma das conversas mais aguardadas do congresso era a de Pedro Costa Ferreira, presidente da APAVT, com o ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, que decorreu no último dia de congresso, em torno dos temas ‘mais quentes’ da atualidade. Nesta conversa, Pedro Siza Vieira começou por contar como passou do Direito para a política, as suas motivações e o facto de estar a ‘tratar’ da Economia do país. “Estou verdadeiramente muito honrado por poder estar no Governo e servir o país.”

Contudo, havia três grandes temas a criar expectativa: o Orçamento de Estado, o novo aeroporto de Lisboa e a TAP. Sobre o primeiro, Pedro Siza Vieira considera que este foi um “desperdício de oportunidade”. “E a sensação que tenho é que os cidadãos e as empresas, de uma maneira geral, não pretendiam que houvesse esta não aprovação do orçamento. As questões que estavam ali em discussão estavam longe das prioridades das pessoas. As pessoas precisam de se concentrar na sua vida, nos seus negócios, em resolver os seus problemas e esperam que, pelo menos, o Estado assegure alguma estabilidade e previsibilidade na forma como os negócios são conduzidos.”

Para o ministro da Economia, a estabilidade tem valor e Portugal tem tido uma grande capacidade de atração de investimento estrangeiro, bem como conta com muita procura turística. “O mundo descobriu Portugal. Quando se fala com investidores estrangeiros um dos fatores importantes que eles relevam, além da qualidade das nossas pessoas, do talento disponível, da grande abertura da nossa economia, uma das coisas que falam é da estabilidade política”, explicou, acrescentando que, na sua opinião, e comparando com outros países, “Portugal passou relativamente bem por esta pandemia, graças à grande coesão nacional e política”, uma “impressão externa de coesão nacional” que faz com que as pessoas procurem o nosso país. E esclareceu ainda que existe capacidade de resposta, “temos capacidade orçamental”.

Sobre a questão em torno aeroporto de Lisboa, Pedro Siza Vieira considera esta história “lamentável”, pela “incapacidade” de uma tomada de decisão. Lembrou a necessidade de aumentar a capacidade aeroportuária em Lisboa e que estes foram “anos perdidos” nesta matéria. “Qualquer decisão que seja tomada tem seguramente vantagens e desvantagens, mas o tempo tem um valor cada vez maior.”

Contudo, Pedro Siza Vieira considera que “não vale a pena termos um novo aeroporto se não tivermos TAP”, já que o crescimento da companhia aérea motivou o aumento do movimento aeroportuário em Lisboa, tal como a procura por parte de outros operadores. “É absolutamente crítico para mantermos esta ligação direta ao mundo termos uma companhia que faz do Aeroporto de Lisboa o seu hub.”

Estando na ponta da Europa, Portugal precisa desta ligação, defendeu, por ser “essencial para a centralidade que temos, para a capacidade de atrair investidores estrangeiros, atrair grandes eventos”. Segundo o ministro da Economia, todos os Estados fizeram grandes apoios às suas companhias aéreas durante a pandemia. “E a ideia que temos é de preservar esta capacidade instalada para depois na recuperação ela poder responder. O esforço estamos a fazer na TAP deve ser visto como um investimento que todos estamos a fazer num ativo que é estratégico para o país.”

 

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Pedro Simas

 

“As vacinas são seguras, eficazes e eficientes”

Pelo congresso da APAVT passaram diversos especialistas, para falar ao longo de três dias de vários temas importantes para o setor. Miguel Lacerda, da associação ambiental CascaiSea, partilhou a sua história ligada ao mar e falou da necessidade da preservação da natureza, enquanto fator de sobrevivência do turismo. Também nesta linha, foi ainda abordado o tema da sustentabilidade, com destinos e empresas a partilharem as suas boas práticas e as suas estratégias. Foi na sessão ‘Sustentabilidade – sim ou sim?’ que também foi apresentado o caso de estudo dos Açores, que tem feito “uma utilização muito inteligente dos recursos”, como contou Carolina Mendonça, coordenadora da Açores DMO.

Pedro Simas, o virologista e investigador do Instituto de Medicina Molecular, explicou que “a pandemia no mundo não acabou, mas vai acabar rapidamente”. É que “tudo mudou” com a vacinação; há menos mortes, apesar do aumento de casos de infeção. A passagem é de pandemia para endemia, de que é exemplo o vírus da gripe. “Não vai ser por causa da Covid-19, que nos vamos descontrolar como no ano passado. Não vamos regressar ao passado. Temos a vacinação. A ciência funciona. As vacinas são seguras, eficazes e eficientes. E, portanto, temos de ter alguma cautela quando impomos restrições”, referiu Pedro Simas.

Paulo Portas, ex-vice-primeiro-ministro e ministro dos Negócios Estrangeiros, também participou no congresso da APAVT para falar da recuperação pós-pandemia, partilhando algumas reflexões geoeconómicas e geopolíticas, e a sua visão sobre as questões do crescimento, a retoma e o futuro da economia. Paulo Portas apontou algumas tendências, a que temos de nos “habituar” em vez de “estranhar”: o epicentro de gravidade económica do mundo passou para a Ásia, sendo que a China está no epicentro deste crescimento global; é um erro pensar que os Estados Unidos estão num declínio irreversível; a Europa tem pela frente um dilema estratégico, já que depende mais economicamente dos mercados asiáticos do que os Estados Unidos. Quanto a Portugal, lembrou que é um país de navegadores e que encontra sempre oportunidades nas dificuldades. “Não há parte nenhuma do mundo, onde o nome de Portugal seja ignorado”, frisou Paulo Portas, que defendeu ainda que “Portugal deve construir bem o seu caso de competitividade, porque, quando as economias abrirem completamente, toda a gente vai lutar pelo mesmo capital ao mesmo tempo, porque toda a gente vai querer levantar-se do chão mais depressa. E, portanto, nós temos de saber em que é que queremos ser competitivos e aí ter a ambição de estar entre os melhores”.

 

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Paulo Portas

 

Maria João Leite*

*Viajou a convite da APAVT

 

© Maria João Leite Redação