Fornecedores não baixam os braços
03-04-2020
“A nossa atividade parou por completo”, lamenta Márcia Ferreira, da direção de comunicação da Mainvision, empresa de audiovisuais. Foram dois dias negros em que todos os eventos dos meses seguintes foram cancelados ou adiados. “Mas os adiamentos parecem-me uma utopia”, refere a responsável.
Márcia Ferreira, Mainvision
A EventKey, que atua na área do software para eventos, passou de um panorama de meses atarefados com um grande número de eventos, para no espaço de uma semana serem todos cancelados e adiados. “Nessa semana antes mesmo de atender um telefonema, já antecipava qual o assunto!”, conta Urbano Machado, diretor da empresa. O responsável carrega ainda a “esperança de que em setembro, outubro e novembro possamos retomar à normalidade, o que permitirá recuperar alguns investimentos feitos”.
Nunca a Imppacto pensou sofrer tamanho impacto.”Parece um pleonasmo utilizar a palavra impacto na nossa empresa neste momento, mas a realidade é que foi enorme, e não no bom sentido”, comenta Paulo Pinto, administrador da empresa de catering. Quando as medidas de contingência foram impostas, a Imppacto adoptou-as de imediato “porque preservamos a segurança dos nossos colaboradores, funcionários e fornecedores parámos por completo toda a produção e todas as equipas foram para casa.
Planear nova oferta
O teletrabalho ajusta-se mais a determinado tipo de empresas. Numa de catering a ideia parece complicada. Na Imppacto as equipas de produção (cozinha, pastelaria, decoração, logística, compras) estão sem atividade; enquanto que as equipas comerciais, de comunicação e financeira estão a trabalhar de casa parcialmente. ”Continuamos a responder a pedidos de propostas de clientes e colaboradores, e o nosso departamento financeiro está a gerir toda a situação para encontrar medidas e estratégias que nos permitam segurar todos os postos de trabalho”, adianta Paulo Pinto. Além disso, “estamos neste momento também a criar estratégias de comunicação interna para encontrar soluções mais criativas para os nossos eventos. Através das plataformas digitais que temos disponíveis, temos procurado juntar todas as equipas em regime de teletrabalho para criarmos novas ideias, novas soluções e menus para que quando tudo isto passar, e acreditamos que irá passar, podermos ter opções novas para todos os nossos clientes, fornecedores e colaboradores”.
Paulo Pinto, Imppacto
“Ficar parados é algo de que não gostamos”, refere Urbano Machado, da EventKey. E o facto de serem uma empresa tecnológica permite continuar o desenvolvimento de soluções e produtos. “Estamos a aproveitar o tempo de paragem forçada para desenvolver novos produtos e módulos, bem como a dar seguimento a solicitações dos nossos clientes, que por motivos de agenda ainda não nos tinha sido possível concluir”. Além disso estão a procurar “antecipar tudo que possa ser antecipado”, tendo como foco “a retoma”. O objetivo é estarem a 100% em setembro e “disponíveis para estar no terreno junto dos nossos clientes, e conseguir fazer um ano de trabalho, concentrado em três meses”. Até ao dia de colocar o pé no terreno, mantêm todo o apoio técnico aos clientes à distância.
Esta paragem forçada vai permitir, ainda, à EventKey aprofundar e estudar “soluções de streaming e ferramentas para eventos virtuais”, mas sempre tendo que mente que estas são temporárias, “pois num evento virtual, a essência, a emoção e a partilha inerentes a um evento nunca será a mesma”.
“Na Mainvision recusamo-nos a baixar os braços”, diz Márcia Ferreira, que refere que “é muito estranho para uma empresa de Audiovisuais estar em teletrabalho”. Mas estão a aproveitar para desenvolver formatos de eventos virtuais, reorganizar procedimentos e elaborar propostas para o futuro.
Crédito olhado com desconfiança
Nesta série de trabalhos que temos feito sobre o impacto da Covid-19 no setor dos eventos, uma ideia ressalta: o crédito não é uma solução. Urbano Machado, da EventKey, concorda. “Vemos o recurso ao crédito como uma proposta muito perigosa, dada à incerteza atual do que irá acontecer nos próximos meses. Um crédito sobreposto às dificuldades atuais é uma combinação potencialmente explosiva no que toca à probabilidade de incumprimento”. “Dado que a EventKey nasceu e cresceu em tempos de crise, a liquidez, a previsão orçamental anual e o capital sustentável para investir, foram sempre três grandes pilares”, pelo que hoje está preparada para garantir a continuidade, sem recurso a empréstimos.
Urbano Machado, EventKey
O responsável da Eventkey aplaude a sensatez das medidas de layoff, mas refere a falta de uma medida, “que seria a criação de uma comissão de especialistas (com informação privilegiada dos mais variados quadrantes científicos, médicos, matemáticos e económicos) para elaborar previsões e cenários sérios para a economia, da mesma forma que o fazem para a pandemia”. Urbano Machado considera isto muito importante para preparar o arranque da economia.
”Ninguém previa tamanha calamidade. Nem o Estado soube o que fazer e a meu ver, limitou-se a ligar as empresas às máquinas para que elas não falecessem”, diz Márcia Ferreira, da Mainvision, alertando também ela que o endividamento não é “uma estratégia sustentável”, pois trará problemas mais à frente.
Paulo Pinto, da Imppacto, coincide na mesma opinião, dando uma sugestão alternativa, “era preferível linhas de financiamento a fundo perdido que pudessem dar alguma margem de segurança às empresas. Não é só salvar a empresa neste momento, é salvar postos de trabalho e fontes de rendimento de famílias inteiras que trabalham nos eventos”.
Os eventos vão voltar
“Creio que a retoma vai ser demorada, sobretudo ao nível da confiança das marcas em termos de segurança nos eventos”, teme Márcia Ferreira, mas ao mesmo tempo acredita que “esta dimensão humana e presencial que caracteriza os eventos não vai acabar, mas seguramente que este será um ponto de viragem na forma como pensamos os eventos, e isso não tem que ser necessariamente mau”. A responsável de comunicação da Mainvision ressalta que “se há coisa boa que podemos levar desta tragédia é a evidência da importância do espírito associativo e da entreajuda. Afinal, estamos todos no mesmo barco”.
O administrador da Imppacto está convencido de que o mercado que vai recuperar mais rápido será o nacional. “Serão as empresas portuguesas, agências ou clientes diretos os primeiros a voltar ao contacto”. No entanto, Paulo Pinto lembra que o estigma provocado pelo vírus vai demorar a desaparecer, “sendo o Turismo uma das áreas mais afetadas com esta crise sanitária e económica, é provável que as pessoas não queiram viajar tão depressa”. O responsável da Imppacto luta entre ter um pensamento positivo e a consciência das dificuldades que se aproximam. ”Embora seja difícil, queremos acreditar que mantendo o foco no que é o nosso core business quando voltarmos será com esperança e força de que conseguiremos continuar a oferecer aos nossos clientes, colaboradores e funcionários, aquilo que é a nossa assinatura: ‘Momentos únicos, para si’”!
Urbano Machado, da EventKey, antecipa que “a livre circulação de pessoas será muito mais restrita a curto e médio prazo, portanto os eventos a nível nacional poderão ganhar mais relevância para as empresas nacionais, mas neste momento é muito cedo para definir cenários, só o tempo o dirá”. O responsável acredita ainda que o corporate recupere mais rápido, “porque as empresas vão necessitar de motivar e mostrar a sua vitalidade a colaboradores e clientes, e só mais tarde o associativismo, sobretudo os congressos médicos”. Os congressos médicos, de resto, são uma das principais preocupações de Urbano Machado, que teme que fiquem “em standby durante mais tempo, dado que o setor médico é um recurso vital para controlo desta pandemia e terão que por essa razão ser ‘protegidos’ por um período maior de tempo”.
Cláudia Coutinho de Sousa
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