“O Kultura Vírus”

28-04-2020

# tags: Espetáculos , Festivais , Eventos , Cultura

A terceira guerra mundial começou. O inimigo não é outra nação humana, mas sim um exército invisível que se chama Covid‑19.

Os efeitos da guerra são iguais a qualquer outra, com vítimas mortais e destruição do nosso modo de vida e da economia. Estamos confinados a casa há semanas e, como alunos bem comportados, assistimos todos os dias na televisão aos responsáveis políticos a fazerem aquilo que nos dizem para não fazermos: manter relacionamento social.

Este país abençoado por Deus à beira mar plantado, sem dúvida o melhor país da Europa para se viver, além do clima fantástico, luminosidade, gastronomia, paisagem, geografia e povo, parece ser um local onde a Covid‑19 se dá mal.

Este país que se tornou num dos principais destinos turísticos do mundo, tem conseguido manter o controlo do vírus, graças ao confinamento da população, em consonância com a oferta hospitalar disponível e isso tem garantido um nível, felizmente para nós, baixo, quando comparando com as grandes nações do mundo.

Para país de remediados, onde o apoio às empresas fechadas, que se vêm forçadas a recorrer ao layoff, é um dos mais baixos da Europa, os empresários mantêm a resiliência em acreditar que vamos ultrapassar tudo isto, e rapidamente voltar ao normal. Aquilo que raramente nos dizem nas notícias, apesar do Estado português garantir 70% de 2/3 do salário bruto, até a um plafond máximo, outros países apoiam muito mais o seu tecido empresarial, como Espanha que garante 70% do salário bruto, e França 85% do salário bruto. Assim as empresas estão enxutas para começarem com fôlego no primeiro dia da retoma.

Esta crise não é igual à de 2011, em que o Estado entrou em bancarrota, pelo contrário esta crise é das empresas e das pessoas, pelo que a retoma tem que ser feita com medidas de alívio fiscal para alavancar o crescimento, e não com aumentos de impostos. Esta crise tem de ser comandada pelo ministro da Economia, e não pelo ministro das Finanças.

O setor da cultura necessita de medidas específicas de apoio à retoma. É imperativo! O filão do turismo não se deve ao sol e praia, mas sim à cultura. As pessoas viajam para Portugal fundamentalmente por motivos culturais, porque para irem à praia vão para destinos como Cabo Verde, Caraíbas ou Tailândia. O que as motiva a escolher um destino é a cultura. O património, os espetáculos, os museus e exposições, a gastronomia e a paisagem são fundamentais. São estes a verdadeira máquina que impulsiona os fluxos turísticos e, por isso, a cultura tem de uma vez por todas de fazer parte dos incentivos do ministério da Economia e do Turismo de Portugal. Não faz sentido manter a cultura confinada a um ministério cuja função empírica comum é o de manter património e as artes das minorias. A cultura tem de ser levada a sério desta vez.

A cultura foi o primeiro setor a fechar com a crise e, tudo indica, vai ser a ultimo a abrir após a retoma.

Por isso, o governo deve implementar um plano de apoio à atividade, assim como implementar políticas de alívio fiscal para na fase da retoma alavancarmos a economia cultural e dos eventos.

Medidas simples e eficazes como as aplicadas na Política Agrícola Comum em que se pagava aos agricultores para não cultivarem. O nosso setor, caso nos mantenham fechados, tem de ser subsidiado, e o governo deve, junto do Eurogrupo, pedir uma linha direta de subsídio para as empresas se manterem, enquanto lhes for vedado o exercício da sua atividade profissional. Caso contrário, a larga maioria extingue‑se.

Por outro lado, políticas de alívio fiscal devem ser aplicadas para incentivo ao consumo cultural, tanto em sede de IRC, como de IRS. Bilhetes para espetáculos, museus e exposições devem ser considerados custo direto das empresas, e não sujeitas a tributação autónoma, e o IVA deve ser dedutível. Assim, incentivamos as empresas a convidarem os seus clientes e colaboradores.

Dedução específica de despesas com espetáculos, museus e exposições em sede de IRS como forma de incentivo ao consumo é também uma outra medida necessária.

Temos saudades de um palco e das palmas do público e somos indispensáveis à sociedade.

Ninguém imagina o mundo sem espetáculos. A experiência do ‘ao vivo’ é insubstituível e bem de primeira necessidade dos povos modernos.

Para terminar uma frase de Maurice Merleau‑Poty: “O artista é aquele que fixa e torna acessível aos demais humanos o espetáculo de que participam sem perceber.”

The show must go on.

 

Alvaro Covões Diretor da Everything is New
 

 

© Nuno Conceição

 

 

 

© Álvaro Covões Opinião

Diretor da Everything is New

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