Análise das perspetivas económicas: PPR e Plano de Reativação do Turismo
31-08-2021
O turismo é um dos pilares da economia portuguesa, é a maior indústria exportadora e o seu impacto na economia e na sociedade vai muito além do perímetro óbvio da sua atividade, tendo sido responsável, entre outros exemplos, pela reabilitação dos centros históricos das duas principais cidades do país.
Ao seu impacto no plano do emprego direto e indireto acresce o forte impacto nas economias locais das regiões de baixa densidade do interior e a contribuição para a sustentabilidade do património histórico, monumental e cultural (a maioria dos visitantes dos museus e monumentos nacionais são turistas).
A pandemia covid‑19 impôs restrições à mobilidade e outros comportamentos, que ao “eliminar” o turismo, em particular o internacional, veio demonstrar o que é Portugal sem turistas e as consequências desta ausência no plano social e económico.
O turismo foi efetivamente a atividade que sofreu o maior impacto com a pandemia. Foi com perplexidade que constatámos que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), na sua primeira versão, não incluía qualquer referência ao turismo, ignorando o seu papel na economia nacional e o seu potencial como fator de recuperação da mesma, como, aliás, ficou demonstrado na crise anterior.
Posteriormente, e após a apresentação da versão final, fomos confrontados com uma nova abordagem que levanta dúvidas: destinando‑se o PRR a financiar mudanças estruturais, não sendo necessárias mudanças estruturais no turismo, estaria assim justificada a sua não referência autónoma no PRR.
De acordo com a abordagem, a ausência de referência no PRR seria porque o turismo é muito competitivo e não necessita de mudanças. Trata‑se de uma ideia que os nossos principais concorrentes não assumiram, nomeadamente Espanha, o destino mais competitivo do mundo (WEF – WTTCI 2019), e Itália, o 8º destino mais competitivo no ranking. Ambos os países fazem referência específica ao turismo e dedicam‑lhe 5% e 7%, respetivamente, dos investimentos previstos nos seus PRR (e cultura, no caso de Itália). Será que esses países mais competitivos do que Portugal (14º do ranking) necessitam de “reformas estruturais”?
A não contemplação de apoios / investimentos no PRR ao turismo vai aumentar o “gap” em relação aos destinos nossos concorrentes, que, sendo mais competitivos do que Portugal, optaram por investir no turismo.
Em relação ao Plano de Reativação do Turismo (PRT), do qual só sabemos o que foi expresso num “powerpoint” com muitos números, poucas explicações e detalhes, quer quanto à concretização das ações nele previstas, quer quanto ao horizonte temporal da sua execução (o documento refere ações a curto, médio e longo prazo, metas 2027 …). O quadro em termos gerais é:
‑ dos 6,2 mil milhões, 3 mil milhões (50%) são instrumentos de financiamento, entre os quais Garantia Pública para Refinanciamento / reescalonamento da dívida pré covid e linha de financiamento com garantia para necessidades de tesouraria. O montante total é indicativo e não está repartido nas componentes.
‑ 1.075 milhões para financiamento de empresas – várias soluções de financiamento, sem qualquer detalhe quanto à sua repartição e a que segmento empresarial se destinam: grandes empresas, médias, pequenas, micro.
Conclui‑se que 65,7% do plano são instrumentos financeiros, nada tendo a ver com investimento.
Neste particular de apoios ao investimento, são apontados cerca de 1.050 milhões de Fundos do PT 2030, sendo que 210 milhões virão dos Planos Temáticos e 840 milhões dos Planos Regionais.
Ou seja, “afeta” ao turismo entre 2021 e 2027, 3% dos 33.600 milhões do Quadro Financeiro Plurianual.
Cientes de que a capitalização das empresas e o enquadramento das moratórias e garantias são críticos para a operacionalidade do turismo nacional, leva‑nos a concluir o seguinte:
‑ O PRR é para ser executado entre 2021 e 2023 ‑ 2 anos.
‑ Dos 16,4 mil milhões de euros, 13,9 mil milhões são subvenções, não são empréstimos, o que trará consequências no modelo de apoios a conceder com estas verbas.
‑ O Quadro Financeiro Plurianual é para um horizonte de 2021 a 2027 – logo num horizonte temporal de 5 anos / 6 anos (o ano de 2021 é para apresentar os projetos).
‑ Os 1.050 milhões afetos ao turismo seriam atribuídos com pandemia ou sem pandemia; logo, nada de novo a não ser a referência em concreto aos programas e ações a financiar.
Ou seja, o PRT em nada se compara com a referência em concreto do turismo no PRR, com a contemplação de investimentos em específico nesta atividade, à semelhança de outros setores, entre os quais o Mar e a Cultura. Ainda para mais com o que os nossos concorrentes vão fazer, quer em horizonte temporal, quer eventualmente (não conhecemos o detalhe) em tipologia de apoios (decorrentes das subvenções).
Uma nota final quanto ao IVAucher, e à a discriminação de algumas atividades turísticas neste programa de Reativar o Turismo, nomeadamente a animação turística, que faz parte oficialmente deste setor, estando incluída no Registo Nacional do Turismo e o dos Eventos e Congressos, que faz parte da tutela do Ministério da Economia. O Ministério da Economia e Transição Digital e a Secretaria de Estado do Turismo não podem discriminar as atividades que estão sob a sua tutela, privilegiando umas (nomeadamente a restauração e o alojamento) em relação a outras. Esta realidade vem demonstrar que ainda temos muito caminho a fazer, no sentido de validar este setor perante a visão tradicional e antiquada sobre o que é o turismo e as atividades que o compõem.
Em suma, o futuro está com uma perspetiva pouco clara e, por isso mesmo, não é ajustada às necessidades dos empresários.
O Grupo de Análise Económica da APECATE