Octávio Costa: “A cerveja é uma enorme oportunidade”
03-03-2020
Existe desde 2012 e entrou, sem grandes receios, no mercado dos eventos cervejeiros. Desde a organização da primeira edição do Art Beer Fest Caminha – já considerado “um dos cinco mais importantes festivais do movimento da ‘craft beer revolution’ na Europa” –, a OG&Associados entendeu que seria esse o caminho. A partir do evento de Caminha, onde a empresa está sediada, surgiram outros como o Porto Beer Fest, o Lisbon Beer Generation Festival, o Alameda Beer Fest Faro, o Aveiro Craft Beer Fest ou o Øliva Beer Mind SJM, entre outros. Octávio Costa, responsável pela Comunicação e Desenvolvimento de Projetos da OG&Associados, contou à Event Point como surgiu este projeto, de que forma diferenciadora promovem as marcas e quais as vantagens e desvantagens de trabalhar neste nicho de mercado. O futuro não fecha a porta a novos desafios e segmentos, e “as oportunidades andam numa corrente de ar”.
Como surgiu a ideia de trabalhar neste segmento?
Como organizadores e produtores de eventos, em 2012 olhávamos para o panorama nacional e as novidades ou criatividade estavam de certa forma estagnadas, temáticas em esgotamento ou banalização. O vinho mais do mesmo, a gastronomia em histerias gourmet ou “parolices” de sempre. A música por si só não nos interessava. As medievais e derivados deixavam-nos horrorizados com a vulgaridade e multiplicação. Procurávamos assuntos entusiasmantes para nós e para o público. Procuramos durante dois, três anos e em várias voltas ao globo e, por afinidade e gosto pessoal, a cerveja era um segmento de elevadíssimo interesse desde sempre. Cá dentro víamos o marasmo e a paupérrima cultura cervejeira do consumidor e dos produtores industriais. Lá fora vimos um turbilhão impressionante de produção, produtores, novidade, criatividade, empreendedorismo. Uma revolução gigantesca sobre o tema, a mudar os hábitos e costumes de consumo, o paradigma, a criar empregos, riqueza e sustentabilidade económica, um magma imparável. Quisemos, sem muitos receios, entrar nesse movimento global e trazê-lo para o nosso país, para um mercado amorfo e tomado pela cerveja sem alma e sem sabor, algo que só servia para refrescar, ver a bola e comer uns tremoços, baseado num monopólio repartido por duas marcas dominantes e umas quantas mais com pior desempenho residual e de qualidade. Resolvemos lançar o debate, criar a apetência, mostrar ao consumidor e, sobretudo, ser a chispa de ignição para aqueles que começavam também a pensar em produzir cervejas de qualidade e diferenciadas. Na altura, três, quatro aventureiros. Para nosso espanto, o 1º festival do país – Art Beer Fest Caminha –, onde conseguimos juntar 18 produtores, em grande parte espanhóis, acolhe 20.000 pessoas. Na 2ª feira depois do festival, uma página inteira do Jornal de Notícias dizia: “Caminha, a Meca da cerveja portuguesa”. Estava muito claro que tínhamos iniciado algo importante para nós, e que o país também estava a precisar.
De que forma diferenciadora promovem as marcas?
Desenvolvemos para cada localização onde criamos marcas de festivais um ADN próprio. Objetivos e fundamentos, imagem, marketing e comunicação diferenciados. Criamos formatos e conteúdos ligados a temáticas ou interesses das localizações, com a escala que se adequa a cada festival. É muito importante falar de cerveja, mas é muito importante perceber os locais, as dinâmicas e a dimensão, das áreas ou regiões, dos players ou dos agentes locais, do alcance ou potencial de âmbito nacional ou internacional. Agregamos valor a cada formato com programação lúdica, musical, artística, performativa; ou pedagógica, profissional, de networking. São vetores que se ponderam e criam naturezas em cada evento, dão-lhes forma e substância, mas sobretudo tornam-os únicos e exclusivos, como cada um dos nossos co-promotores, parceiros ou sponsors o merecem e desejam.
Que recursos mais utilizam na promoção das marcas?
As redes sociais foram fundamentais e tiveram um peso quase exclusivo nos primeiros três anos. Conseguimos criar e fazer evoluir festivais apenas com recurso a essas ferramentas. Desenvolvendo-se e cristalizando-se através de públicos-alvo com interesse no tema cerveja, evoluindo e expandindo-se no mote festival/evento com programação musical de interesse. A partir de 2015/16 com as necessidades e estratégias de evolução bem como a capacidade e potencial de parceiros, fomos explorando outras formas de visibilidade em meios, para alcance e proximidade com o público consumidor, utilizador dos festivais, bem como de poder de atração de novos parceiros e patrocinadores. Nos últimos dois anos com a assessoria de Imprensa parceira, a visibilidade ganha consistência também em órgãos de comunicação social e fazedores de opinião, parceiros de média e conteúdos de Imprensa. Internacionalmente, mais especificamente com o Art Beer Fest Caminha e Porto Beer Fest – os de maior escala –, a promoção é desenvolvida em constância junto dos maiores festivais do mundo, no centro da networking cervejeira mundial. O Art Beer Fest Caminha foi mesmo considerado um dos cinco mais importantes festivais do movimento da “craft beer revolution” na Europa.
Que vantagens existem em trabalhar com um nicho de mercado, como o dos eventos cervejeiros? E quais as desvantagens?
A cerveja é uma enorme oportunidade, o mercado cresceu na oferta e na procura nos últimos oito anos. Mudou quase radicalmente. Há cada vez mais e, sobretudo, melhores produtores. Um tema do quotidiano, nos ‘media’, nos hábitos de consumo, na estruturação da cadeia de valor. Desbravar foi o desafio, hoje é acompanhar a evolução e perceber o alcance e o pulsar deste universo tão específico do nicho. Como organizadores de festivais, o nosso papel é criar audiência e atrair público, desenhar o melhor e mais atrativo espaço ou palco, para que os cada vez mais e melhores produtores encontrem o seu público, tornar cada edição mais eficaz e produtiva que a anterior, mais badalada e consistente. Foi e é, de certa forma, uma vantagem ter sido pioneiro e dar continuidade intransigentemente com a criatividade, a novidade e o reconhecimento internacional. Os parceiros e co-promotores nutrem confiança e sentem responsabilidade no que fazemos e potenciamos, sentem-se confortáveis e motivados, partilham do êxito e veem a sua aposta confirmada. Existem obviamente desvantagens, talvez das mais gritantes o facto de um tema de nicho e ainda baseado numa economia de média/baixa escala determinar uma limitação, racionalização e pragmatismo nos passos. Uma cadeia de valor ainda imberbe e com dores de crescimento naturais, um mercado recente e em transformação na novidade. Por vezes procuramos parceiros óbvios e eles não existem ainda no mercado ou não tem ainda a estrutura para se poder agregar às nossas operações.
Estão abertos a outros segmentos?
Sim, claramente. A experiência adquirida leva-nos a procurar exatamente da mesma forma as “next big thing”. As oportunidades andam numa corrente de ar, com critério e visão iniciamos já novas marcas temáticas para festivais no futuro mais próximo. Outras estarão ainda a fermentar para médio prazo. Mas, temos um compromisso enorme com a cerveja artesanal, os produtores, o consumidor e os nossos parceiros. As marcas de festivais que criamos e operamos anualmente, são sinónimo de consistência e evolução em sequência. No último dia de cada um, iniciamos a edição do ano seguinte. As portas de grandes eventos internacionais também se vão abrindo, em co-organização com sócios internacionais de festivais reconhecidos ou para certames mais pontuais, como o caso do 8x8 Beijing Festival ou o Craft Convention Ásia, em Taiwan, já para 2020.
A empresa está sediada em Caminha. O facto de estar localizada fora de grandes cidades, como Lisboa e Porto, é uma mais-valia ou traz contratempos?
Somos tão eficientes como se estivéssemos centralizados, estamos conectados fortemente e em vários pontos de vista técnico e prático com o mundo inteiro. Em boa verdade, estamos ainda mais motivados por estarmos sediados fora dos grandes centros, pela natureza das vidas pessoais e da facilidade e amabilidade confortável de viver fora de zonas urbanas. Mas claro, fazemos as nossas viagens, muitas, fazemos as nossas reuniões por todo o país. Isso são custos, mas temos com certeza a mesma poupança de custos e recursos por estar em meios mais pequenos. Conseguimos encontrar aqui e rodear-nos de colaboradores com enormes valências, formação e talento que nos permitem dar soluções às nossas necessidades operacionais e de gestão. Existe na nossa convicção um pensamento de que a vida social e familiar relaxada e sem o stress das cidades é uma vantagem imperdível que se manifesta de forma inequívoca profissionalmente. Em Caminha, onde fazemos a nossa vida diária, recebemos profissionais de todo o mundo e que por vezes nos dizem que também aqui gostariam de viver ou trabalhar. De resto, estamos por dentro e muito comprometidos com o maior valor que possuímos: a nossa networking, do nosso reconhecimento internacional no universo cervejeiro e como organizadores de festivais deste tema. Costumo dizer que o aeroporto do Porto está a 45 minutos de Caminha de carro, em alguns dias, este, fica mais perto de nós que da cidade do Porto.
A empresa existe desde 2012. Como pode descrever o seu percurso?
Tem sido um percurso de evolução constante e progressivo. Por vezes com alguma vertigem e por outras com algum travão necessário a qualquer corrida desenfreada. Não receamos os sonhos, projetos ou desafios. Por vezes temos receios do país, das suas dificuldades conjunturais, temporais, políticas, financeiras, fiscais, sociais, que são inquietudes de tanta gente que, acordada e atenta, percebe um país que por vezes é titubeante e incoerente. No tema cervejeiro, temos em carteira e em sequência nove festivais de média e grande escala. O compromisso é dar-lhes cada vez mais força, prestígio e sucesso. Mas a tendência natural é também evoluir e fazer crescer outros temas. Gostamos de percursos, motivam-nos! Mais ainda que os destinos.
Maria João Leite