Os venues e a adaptação à nova realidade
06-04-2020
São espaços para grandes eventos, de lazer ou de negócios, lugares que acolhem habitualmente vastas audiências. O impacto da pandemia tem sido forte no setor e, por todo o mundo, sucedem-se os adiamentos ou cancelamentos de eventos. São tempos sem precedentes, terreno novo e um período de adaptação e reinvenção. Perante este momento de incerteza, o que é feito destes espaços? Foi o que a Event Point quis saber, junto do Altice Forum Braga, Altice Arena e Centro de Congressos do Estoril.
O último espetáculo a que o Altice Forum Braga serviu de palco foi o “Casal da Treta”, que teve lugar a 7 de março. Embora sem estar atualmente a acolher eventos, o calendário do venue bracarense “apresenta uma ocupação, para o período de julho a dezembro, superior a 80%”, conta fonte da administração da InvestBraga, responsável pela gestão do espaço, acrescentando terem “reservas significativas” para junho, mas que está em “avaliação” a necessidade de poderem vir a ser alteradas. Os cancelamentos efetivos no Altice Forum Braga têm sido poucos e os clientes estão a optar por adiar os seus eventos. “A nossa política tem sido a de apoiar os clientes, aceitando os adiamentos sem penalizações, e permitindo que as mesmas possam ser efetuadas ainda em 2020 ou 2021 desde que a reserva fique liquidada, o que tem sido bem aceite”, explica a InvestBraga.
Altice Forum Braga
A Altice Arena tem “transversalmente uma postura de parceria” com os clientes e, “em virtude da situação excecional que vivemos”, tem tentado “encontrar a melhor solução para cada evento de forma a minimizar os impactos desta crise que afeta este sector de forma violenta”, refere Jorge Vinha da Silva, CEO da Altice Arena. E adianta: “Na prática, tem-se aplicado aos eventos não realizados um retainer fee que garanta o trabalho já realizado nos projetos. A montante garantimos a continuidade dos nossos contratos de fornecimento em termos de edifício, que não pode parar a 100% para minimizar o impacto no ecossistema.” Foi também a 7 de março que a Altice Arena recebeu os seus últimos eventos: o SISAB – Salão Internacional do Setor Alimentar e Bebidas e o concerto de Tarja. E, desde então, e na maioria dos casos, os eventos marcados têm sido reagendados para o último trimestre deste ano ou para o primeiro trimestre de 2021.
A sofrer os impactos, “como toda a indústria em geral”, o Centro de Congressos do Estoril está atualmente ao serviço da comunidade, “sendo nesta fase o maior Centro de Testes Covid-19 no concelho de Cascais”. Segundo Alexandra Torégão, diretora do Centro de Congressos do Estoril, a política de adiamentos e cancelamentos do espaço “não é muito diferente do que era” antes da pandemia, o que significa que é de “estreita colaboração” com os clientes e parceiros. “Reagendamos dentro da nossa disponibilidade e tentamos encontrar, em conjunto, as melhores soluções, porque somos todos envolvidos e, cada um por si, uma parte ativa da solução. Estamos todos no mesmo barco”, afirma Alexandra Torégão. “E é com esta perspetiva de colaboração que encaramos o presente e o futuro”, sublinha.
Alexandra Torégão, diretora do Centro de Congressos do Estoril
Reagendar eventos e apoiar os clientes
Aquando do aparecimento dos primeiros casos de Covid-19, ainda antes de ser decretado o estado de emergência no país, a InvestBraga, em coordenação com a Câmara Municipal de Braga, desenvolveu e implementou um plano de contingência “com medidas específicas, para salvaguarda da segurança dos seus colaboradores”, explica a entidade que gere o Altice Forum Braga. Em concreto, existe uma estrutura em regime de teletrabalho e um conjunto residual de trabalhadores que visitam regularmente o espaço, “para assegurar o funcionamento dos serviços mínimos, atendimento telefónico e apoio ao centro de rastreio da Covid-19 que acolhemos no nosso estacionamento”.
“As áreas onde estamos a concentrar o nosso trabalho são as da comunicação, com particular incidência nas redes sociais”, onde o Altice Forum Braga presta esclarecimentos e divulga informação sobre os eventos e outra transversal associada à pandemia. “Na vertente comercial, estamos a manter um contacto regular com todos os clientes, não só acertando calendário, como enviando propostas e informações”, explica fonte da administração da InvestBraga, acrescentando que estão também a “trabalhar toda a componente de normas, regulamentos e documentação técnica, introduzindo melhorias” e que as componentes administrativa, financeira e de recursos humanos mantêm a sua atuação, “mesmo que à distância”.
A Altice Arena está a aproveitar esta altura “para desenvolver e aperfeiçoar ferramentas de gestão e melhorar os sistemas, adequando a organização a novas práticas”, como explica Jorge Vinha da Silva. Este é o mote. As circunstâncias aceleraram a digitalização dos processos de trabalho, o que já ocorria em certa medida. “Neste momento, o trabalho tem sido intenso na área de eventos e gestão de clientes, no reagendamento de todos os eventos e na gestão futura da agenda, em termos de conciliar esses mesmos adiamentos com os eventos já previstos para o futuro. Essa tendência acentua-se ainda mais na meetings industry, em que os eventos são planeados com muita antecedência.”
Jorge Vinha da Silva, CEO da Altice Arena
Na Altice Arena, há trabalhos de manutenção do edifício e sistemas que continuam a funcionar, “pelo que temos ainda alguns trabalhos presenciais, ainda que reduzidos ao mínimo indispensável”. Segundo Jorge Vinha da Silva, também na blueticket, a outra empresa do grupo, a atividade permanece em teletrabalho. “Por um lado, para dar resposta ao cliente final no que diz respeito aos reagendamentos; por outro lado, a equipa de IT e clientes continua a trabalhar na manutenção das soluções instaladas nos clientes, ainda que sem a pressão dos eventos ou visitantes do turismo, pois toda a atividade económica se encontra parada.” As áreas de formação mantêm-se ativas e existem várias iniciativas de webinar organizadas por associações internacionais onde o venue está representado, como a ICCA – International Congress and Convention Association ou a EAA – European Arenas Association, por exemplo. “É também uma forma de contribuir para a subsistência das empresas que colaboram connosco nas áreas da formação, bem como do bem-estar emocional dos nossos colaboradores.”
Uma vez que o Centro de Congressos do Estoril conta com um centro Covid, uma parte da atividade do venue mantém-se “inalterada”, sendo que a restante equipa mantém “o contato diário e ativo”, pelos vários meios disponíveis.“Tempos extraordinários como os que estamos a viver podem também ser encarados como oportunidades. O objetivo tem sido reforçar o espírito de equipa, a motivação e o ambiente corporativo, e assim adaptarmo-nos a esta nova realidade e às dificuldades inerentes aos desafios de uma nova forma de comunicação, porque a nossa cultura é formada pelo convívio diário e interação com outras pessoas”, frisa Alexandra Torégão.
A equipa continua a desenvolver os projetos que tem em mãos e a responder a pedidos de propostas de clientes e parceiros. E porque este é um “período de reinvenção”, estão pensadas uma série de iniciativas online para a equipa de trabalho, “com o objetivo de sairmos reforçados e ainda com mais competências”. “Aproveitamos também para repensar a nossa atividade, novas ideias, num futuro de incertezas, acreditando sempre que esse ‘hoje’ incerto irá terminar já ‘amanhã’!”, sublinha a diretora do Centro de Congressos do Estoril.
Centro de Congressos do Estoril
Ainda é cedo para avaliações
E como vê o Altice Forum Braga as medidas do Governo para minorar o impacto negativo desta pandemia na atividade dos eventos? “Ainda é cedo para avaliar se as medidas vão ter o sucesso pretendido. Todavia é sempre positivo que elas existam, se bem que sabemos que nunca irão satisfazer todos”, começa por dizer fonte da administração da InvestBraga, concluindo: “Parece-nos que todas elas apontam para a situação de empréstimo e consequentemente vão aumentar o endividamento das empresas, o que pode ser negativo no futuro.”
Para Jorge Vinha da Silva, ainda é difícil aferir os reais impactos da pandemia no setor, “pois em bom rigor ninguém pode prever com exatidão o tempo de paragem”, sabendo-se à partida “que serão muito negativos”. O CEO da Altice Arena lembra que a maior parte dos stakeholders teve uma quebra na sua faturação de quase 100%, por estarem impedidos de operar. Certo é que, neste momento, a indústria do turismo, turismo de negócios e entretenimento será “das mais afetadas”, já que foi das primeiras a parar as suas operações e será, provavelmente, das últimas a retomar a atividade.
“É um setor que depende da confiança das pessoas e da mobilidade, seja ela interna ou vinda do exterior. E esta é uma realidade comum a toda a Europa pela informação que temos recolhido através das associações internacionais onde estamos inseridos. As medidas anunciadas até ao momento são positivas para esta fase, nomeadamente as referentes à preservação do emprego o que é muito importante para a estabilidade social. As restantes também são positivas, mas teremos que avaliar a concretização e se efetivamente chegam rapidamente às empresas. Do ponto de vista futuro, ainda que entendamos que será necessário e fundamental um compromisso global por parte da Europa, parece-nos que as medidas terão que ir mais além do que linhas de crédito e adiamento de prazos de pagamento de impostos”, frisa Jorge Vinha da Silva, para quem avaliar como finais as decisões já tomadas “pode pecar por defeito”, pelo que a Altice Arena vai acompanhar a evolução da situação com toda a atenção. “Não pode, nesta fase, ser de outra forma.”
Maria João Leite
Leia também:
Os espaços vão ser insuficientes para tantos adiamentos de eventos
A situação na Europa: “A indústria dos eventos foi dos 100% aos zero em dez dias”
Fornecedores não baixam os braços