Que futuro para os profissionais de protocolo?
29-09-2020
O setor dos eventos, a que o protocolo está intrinsecamente ligado, foi duramente atingido e muitas têm sido as mesas redondas e webinars com a participação dos maiores especialistas, nacionais e internacionais, a debruçar‑se sobre esta questão. As conclusões a que chegaram e que nos permitem antever o que vão ser os eventos este ano são basicamente as seguintes:
Sempre que possível, os eventos devem realizar‑se em espaços abertos para permitir a circulação do ar. Ou seja, no inverno vai ser ainda mais complicado. Os espaços devem ser maiores e os convidados devem ser em número menor.
Os cuidados de higienização devem ser muito rigorosos. Deve haver o menor número de operações que envolvam contacto físico desde a acreditação até à entrega de ofertas. Todos devem usar máscaras a não ser quando estão no uso da palavra ou em refeições.
Em relação ao protocolo, mantém‑se a regra de que os anfitriões devem estar à entrada do recinto onde aguardam a chegada das altas entidades oficiais. Os cumprimentos mudaram e o aperto de mão foi substituído por um toque de cotovelos ou pelo “namaste” usado no Oriente.
Havendo necessidade de um maior espaçamento entre convidados, o protocolo continuará a ter de fazer, com alguma antecedência, e muito cuidadosamente, o assentamento, encaixando todos os convidados nos poucos lugares disponíveis. Também terá de assinalar com os nomes de quem vai ocupar esses lugares e marcar os outros a que é proibido o acesso. Deverá igualmente desenhar a mesa de presidência e estabelecer a ordem das intervenções.
E o protocolo no decorrer do evento? Idealmente deverá ser invisível, mas existem inúmeras situações que têm de ser pensadas. Será possível manter um metro e meio de distância quando se acompanha uma alta entidade até à primeira fila? Como deve ser feito o apoio ao palco e à mesa de presidência? Quem faz a higienização do púlpito e do microfone? Deixa‑se o gel sanitário em cima da mesa ou basta estar à entrada do palco e do recinto? Quem substitui as águas e os copos? O protocolo vai ter de ser reinventado. Teremos de abolir a pompa, mas manter a carga simbólica.
A cerimónia do Dia de Portugal este ano foi perfeita por ser minimalista ao mesmo tempo que transmitia a mensagem simbólica desta celebração. No dia 10 de Junho assinala‑se o dia da morte de Luís Vaz de Camões e celebram‑se as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo.
A cerimónia, este ano, durou exatamente meia hora, desde a chegada das mais altas entidades da República portuguesa até ao final do discurso de Sua Excelência o Presidente da República. As cerimónias militares decorreram em frente do Mosteiro dos Jerónimos. A homenagem a Camões foi feita pelo Presidente da República junto do túmulo do poeta na Igreja dos Jerónimos. Os dois discursos sobre o significado de ser português ao longo da nossa história foram feitos no majestoso Claustro que tem sido ao longo dos tempos um cenário emblemático para diversas comemorações. Desta vez, só foi necessário instalar um púlpito, uma bandeira e oito cadeiras para acolher, com grande dignidade, as mais altas entidades portuguesas. Menos é mais.
O Protocolo de Estado atuou de forma discreta, contribuindo para a dignidade e prestígio desta cerimónia. Nos últimos meses, outras cerimónias oficiais foram também organizadas em autarquias ou regiões autónomas com dignidade e segurança. Os funcionários de organismos públicos souberam adaptar‑se à nova normalidade e o futuro desta profissão não parece estar em risco.
Outra realidade é a dos profissionais por conta própria que colaboram no protocolo dos eventos empresariais. Neste caso, como não se realizaram eventos durante o confinamento, o futuro é ainda incerto.
Estou convencida de que mesmo para eventos de menor dimensão, vai continuar a ser necessário contratar um especialista de protocolo, que poderá, à distância ou presencialmente, colaborar com os organizadores do evento. Para que estes saibam, por exemplo, qual a fórmula de tratamento correta para se dirigirem às autoridades presentes. Mas também para elaborar o guião, para definir a ordem das intervenções, para fazer o assentamento, para todas as situações protocolares, desde a chegada até à saída do último convidado.
São tempos desafiantes, mas estou convicta de que melhores tempos virão e que todos vamos saber reinventar o protocolo de modo a adaptá‑lo a esta nova normalidade, que parece ter vindo para ficar.
© Isabel Amaral Opinião
Presidente da APorEP - Associação Portuguesa de Estudos de Protocolo