“Um evento é comunicação em estado sólido!”
13-11-2024
# tags: Comunicação , Eventos
Cada vez que sou desafiado a traduzir uma mensagem específica para um público definido recordo esta frase lapidar, que há muito anos ouvi de um conceituado organizador de eventos, já retirado.
Com efeito, qualquer momento que interpele um membro do público que participe num evento poderá dar forma a uma memória divergente da mensagem que se pretendia transmitir.
Um exemplo recente deste fenómeno foi a recente realização do Rock in Rio Lisboa’24: uma agenda musical bem construída que gerou três dias de lotação esgotada, um espaço mais amplo e um enquadramento de grande beleza que proporcionaram condições espaciais únicas, mas as muitas mensagens de dificuldades nos apoios ao público tiraram algum brilho a esta edição do evento.
É certo que as comunicações digitais e as media sociais transformaram cada um de nós num agente de comunicação altamente eficaz, e que a nossa mensagem – nem sempre objetiva, por vezes até ditada por necessidades ou interesses pontuais –, essa mensagem pode ser potenciada por esta última indução.
Mas o efeito multiplicador dos novos modelos de comunicação valida todas as fontes e transforma qualquer simples mensagem numa feroz realidade!
Daí que a gestão dos detalhes assuma, na organização de um evento, um papel cada vez mais relevante para quem tem a responsabilidade de lhe dar forma e conteúdo.
E é a partir dos bastidores, ou backstage, que decorrem todas as tarefas da organização para que um evento concentre a atenção e o apreço do público, gerando boas memórias e um word of mouth positivo.
Geralmente invisíveis, os bastidores são o cérebro de qualquer evento, concentrando o conjunto de pessoas que produzem um evento, sendo responsáveis pelo seu planeamento, implementação e gestão.
Nos últimos anos os bastidores dos eventos mudaram muito, tornando-se maiores e muito mais complexos, acompanhando as exigências físicas e tecnológicas de eventos maiores e mais exigentes. Conferências e reuniões com milhares ou milhões de participantes presenciais (quem não recorda a JMJ’24!! [Jornadas Mundiais da Juventude]) e muitos milhões online, provas desportivas, festivais e espetáculos, entre outros, colocam hoje grandes exigências às organizações e aos seus novos stakeholders: alojamentos, transportes, segurança, comunicações e tecnologia, a todos sendo exigida plena capacidade de resposta e onde falhar não pode ser opção!
Os bastidores hoje congregam várias equipas de trabalho, cada uma com a sua missão específica, as quais desempenham as respetivas tarefas, resolvem os problemas que possam surgir, arranjam soluções. Estas equipas começam a trabalhar muitos meses antes do evento, conhecendo até ao pormenor os locais onde o evento vai decorrer, antecipando dificuldades e possíveis problemas, planeando a sua intervenção com rigor para que qualquer fenómeno imprevisto cause o menor impacto no decurso do evento.
E todos recordamos alguns fenómenos imprevistos com que a natureza pode colocar à prova o bem estar dos participantes e a capacidade dos organizadores lidarem com necessidades súbitas de multidões multiculturais ansiosas, pelo que os planos de segurança e de cibersegurança acompanharam a evolução dos eventos, planeando soluções rigorosas de evacuação, de intervenção sanitária e de redundância e autonomia cibernéticas.
Cibernéticas? perguntarão alguns… Sim, cibernéticas. Os eventos transmitidos para todo o mundo a partir de Portugal abriram uma janela que a pandemia escancarou, e não se fechou mais. Hoje, os maiores eventos realizados em Portugal (e no mundo) têm um formato híbrido, i.e. sendo claramente presenciais transmitem partes ou a totalidade dos momentos do evento através das media sociais, alcançando níveis de visualização inacreditáveis. A título de exemplo, um evento organizado em Portugal teve um streaming com mais de 900 views simultâneos em 40 países...
Estas transmissões implicam a montagem de régies e salas de produção, que vão fazer chegar aos media os sinais e os blocos de informação de cada momento do evento.
A cobertura mediática dos eventos é preciosa em termos de retorno para os organizadores, pelo que o rigor nos horários de cada momento é uma linha vermelha, articulada ao minuto com a coordenação e o protocolo/mestre de cerimónias.
E também as “estrelas” mediáticas do evento – conferencistas, artistas, mestres de cerimónias – carecem de alguns cuidados para não aparecerem descompostos. Hoje é impensável não dispor de transportes, camarins e maquilhadoras para garantirem a melhor imagem destas importantes figuras que dão a cara pelo evento.
“Há sempre um estado de alerta, mesmo quando tudo está a correr bem!”, confessa o diretor de um grande e complexo evento desportivo.
Em síntese, o backstage de um evento é hoje uma multitasking warzone que coordena e gere ao segundo cada momento de um evento, onde se revê pela milésima vez o programa, onde se repetem os treinos de cada momento, onde é feito o debriefing de cada momento e se faz o briefing do momento seguinte, e que não deixa escapar qualquer dificuldade pontual para não contaminar o grupo nem o público. What happens in Vegas stays in Vegas...
É nos bastidores que se gerem os detalhes!
© Francisco Toscano Opinião
Vice-presidente da APorEP