Inflação: Setor dos eventos vai ter vários comportamentos

Opinião

09-12-2022

# tags: Eventos , Turismo , Meetings Industry

Antes de mais...Um economista é aquele que consegue prever o passado. Outra forma de dizer que, sendo uma ciência social, a economia vive do comportamento das pessoas e certezas não há.

Um economista é aquele que também não dá certezas, afirma “por um lado isto”, “por outro lado aquilo”… Não se compromete porque é muito fácil errar. Por isso, qualquer semelhança com a realidade futura pode ser coincidência.

O que é a inflação?

A inflação é a subida generalizada dos preços causada pela redução da oferta (o que as empresas oferecem), um aumento da procura (os consumidores) ou pelo efeito combinado das duas.

Como se elimina a inflação?

A inflação é um processo da economia que existe desde que há trocas comerciais. Como processo, pode ser combatido para que se mantenha a níveis baixos, mas não eliminado. A realidade de inflação perto do 0 na União Europeia nos últimos 20 anos é uma exceção na Economia, causada por um controlo por parte do Banco Central da moeda e das taxas de juro.

Quando é que este processo inflacionista que agora vivemos, começou?

A pandemia teve duas fases: a primeira de completo lockdown, onde praticamente se deixou de consumir fora dos bens de primeira necessidade, e alguns setores da oferta fecharam. Não se assistiu a um processo inflacionista porque a oferta acompanhou a procura nos bens essenciais.

Na segunda fase da pandemia, os consumidores começaram a dar sinais de voltar a consumir para lá dos bens essenciais. Nesse momento, a oferta, que em muitos casos deixou de existir, teve dificuldade em acompanhar no curto prazo. Os chips, os componentes automóveis, as matérias-primas para a indústria e mesmo as empresas que as fornecem não são tão rápidas a reagir como os consumidores. Estes podem alterar comportamentos de um dia para o outro, mas a oferta não.

Assim, no segundo semestre de 2021 começamos a assistir a um aumento de preços de um conjunto alargado de bens, causado por uma maior procura do que a oferta desses bens.

E a Guerra na Ucrânia?

A Ucrânia e a Rússia são grandes fornecedores de matérias primas agrícolas e, no caso da Rússia, de gás e petróleo. Sem esses bens, a União Europeia deixou de ter, aos preços anteriores, rações e alimentos para animais, cereais para consumo humano, fábricas de componentes eletrónicos, matérias-primas energéticas, entre muitos outros produtos. E como exemplo da Economia Global, o peru que comemos vem de países como a Polónia que, neste momento, tem milhões de refugiados, gerando mais escassez.

Ora, uma oferta ainda a levantar‑se da pandemia, com escassez de matérias‑primas e aumentos, muitas vezes de 100% ou mais de custos, é uma acha para a fogueira da inflação.

É agora que chegamos aos eventos?

Sim. Era importante referir as causas para compreender o presente. A inflação não é um fenómeno isolado.

Os eventos e outros projetos relacionados deixaram de existir em dois anos, salvo raras e honrosas exceções. Com este cenário, muitos profissionais e empresas fecharam, mudaram de área, ou diminuíram as suas estruturas.

A ausência de números neste setor para sustentar esta afirmação é uma nota importante, fruto de um segmento não regulado e invisível para a Economia.

Tal como no caso dos consumidores individuais, os clientes de eventos “acordaram” e começaram a fazer pedidos. Excelente. Mas a oferta não consegue reagir com a mesma rapidez e ainda hoje está a aumentar equipas, adquirir equipamentos e matérias‑primas.

Isso não causa aumentos de preços por si?

Nim.

O mercado dos eventos tem um conjunto de fornecedores que ombreia com os clientes nas negociações e um conjunto alargado que, sendo muito menor do que os clientes que pedem, tem pouco poder negocial.

Um venue, por exemplo, pode subir preços porque tem menos datas e muitos pedidos, o catering tem de subir preços, porque o custo da alimentação e deslocação aumenta, mas outros setores têm mais dificuldade em fazê‑lo.

E como os clientes têm normalmente orçamentos definidos, a receita global pode não aumentar, mas o aumento de preços existe por força do custo por participante.

E o que pode acontecer nos próximos meses?

No setor dos eventos vamos assistir a vários comportamentos por parte da oferta causados por várias realidades, desde a escassez das matérias primas para a produção de material (merchandising, roll ups, flyers, banners, etc.), ao aumento dos custos de produção causados pela energia, combustíveis e alimentos (catering, custos de transporte, AV), quer pela ausência de profissionais qualificados que saíram deste setor e que, sem perspetivas, não voltarão.

Isto leva a uma reflexão sobre a inflação: o setor trabalho é o mais penalizado, porque os salários normalmente não aumentam, nem no mesmo período, nem na mesma percentagem do que a inflação. Precisamente porque quem quer controlar a inflação quer controlar o consumo.

Não falamos ainda das taxas de juro: empresas com tesouraria frágil terão de suportar custos de empréstimo cada vez mais elevados. É uma novidade em mais de 20 anos, mas quem tem mais alguns anos, recorda-se de taxas de juro de 5%, 10%, ou mais. Agora existem políticas de contenção que não existiam, mas pode acontecer se a inflação não diminuir.