Congresso da APAVT: “A IA somos todos nós”
25-10-2024
# tags: APAVT , Congressos , Turismo , Turismo de Negócios , Tecnologia , Empresas
No 49º Congresso da APAVT – Associação Portuguesa da Agências de Viagens e Turismo, Sérgio Ferreira, partner da EY, abordou o tema da inteligência artificial.
Na sessão ‘IA – uma jornada para todas as empresas’, Sérgio Ferreira levou os delegados numa viagem do início da humanidade em direção ao que estamos a viver hoje. “Estas máquinas, hoje, são capazes de falar connosco, escrever, ler, pensar, raciocinar, falar em qualquer língua, produzir textos, produzir vídeos, produzir imagens, e isso é o pior que elas vão ser”, já que todos os dias elas vão “continuar a ter esta capacidade criativa”.
Sérgio Ferreira apresentou três grandes tendências (quantum AI, embodied AI e brain-machine interfaces) e três grandes mudanças em curso: “Nós hoje estamos a viver um mundo de organizações algorítmicas, o mundo está, claramente, a passar por transações para experiências relativamente aos comportamentos enquanto seres humanos e, por último, estamos a criar um mundo autónomo.”
Sendo esta uma tecnologia a que todos têm acesso, o desafio é como criar novos produtos e serviços diferenciadores ou novos modelos de negócio. Sérgio Ferreira mostrou como têm feito a Amadeus, com simulações de operações para poder melhorar a eficiência, ou a Hilton, que “está a criar experiências” – “através do seu concierge ‘Connie’ está a transformar a forma como posso controlar a temperatura do meu quarto, posso fazer check-ins automáticos”, por exemplo.
Cinco pilares importantes para uma jornada de sucesso, no sentido em que as empresas possam aproveitar as vantagens da inteligência artificial, são: ter uma estratégia e criar um conselho estratégico de IA; ter ética e responsabilidade; ter literacia e promover formação; identificar casos de uso e valor; através de laboratório e fábrica, criar e entregar valor.
Para dar exemplos de como as empresas podem aproveitar a tecnologia, Sérgio Ferreira mostrou um vídeo, gerado pela HeyGen, onde um avatar fala em várias línguas, sendo útil para uma apresentação para vários países, por exemplo. “A oportunidade é gigante, o risco também, mas acho que, se o fizermos bem, vamos aproveitar muito mais do que perdemos.”
Os agentes digitais vão passar as coisas simples diárias e, com a ajuda da IA no trabalho administrativo, está criada a possibilidade de os profissionais poderem ter “tempo para aquilo que tem valor enquanto seres humanos, que são as relações entre vendedor e cliente ou parceiro de negócios”.
A IA é criativa e a nossa parte é “continuar a ser os curadores e os editores do que eles fazem”. Há que ressalvar que “há coisas que as máquinas ainda não fazem” – elas não têm memórias das relações entre seres humanos, das viagens e das experiências.
Afinal, o que é a IA? “A IA são vocês, a IA somos todos nós. Estas máquinas aprenderam com tudo aquilo que nós construímos em milhares de anos de conhecimento e informação que desenvolvemos e, por isso, elas são feitas à nossa imagem”, concluiu.
Entrevista a Sérgio Ferreira
A inteligência artificial veio transformar a vida das empresas.
Totalmente. Ela já estava presente. Nós temos inteligência artificial tradicional já há muitos anos a ser utilizada em termos de algoritmia para provocar eficiências e automação. Aquilo que está a acontecer hoje foi a democratização que o ChatGPT trouxe; democratizou o acesso e trouxe também para o utilizador comum o potencial e todo o poder que estas tecnologias têm. E isso está a provocar uma torrente de novas oportunidades de transformação nas áreas financeiras, de marketing, de vendas, em que a criatividade e a capacidade que estas máquinas têm de produzir conteúdos é muito acelerada relativamente àquilo que é a capacidade que um ser humano tem. E, por isso, as empresas que já estão a embutir toda esta capacidade em atividades ou tarefas estão claramente a tirar partido disso e a diferenciar-se no mercado.
Que vantagens é que a inteligência artificial tem, por exemplo, no turismo de negócios?
No turismo de negócios é muito claro. Na área de vendas, queremos os vendedores com os clientes, porque é aí que se faz a transação e a conversão da oportunidade. Na maior parte dos casos, temos estas pessoas a fazerem tarefas mundanas e repetitivas de pesquisa de informação, sistematização, produção de documentos. Se estas empresas olharem para as ferramentas e conseguirem fazer a criação destes agentes para produzirem este conteúdo automaticamente, com a supervisão de um ser humano, vão, claramente, ganhar e potenciar muito a conversão. Na área de marketing, a mesma coisa. A produção de uma campanha de marketing, desde a estratégia até ao go-to-market, pode representar semanas e semanas de trabalho. Hoje, nós estamos a fazer isto em dois dias. Entre toda a parte de ideação, estratégia, conceção da campanha até à fase em que fazemos validação final da campanha que vai para o mercado, já com vídeo, com imagem, com som, com tudo o que é email marketing, copy, com conteúdos para os diferentes canais, é tudo feito dentro de dois dias de trabalho.
Na indústria dos eventos, a inteligência artificial também já é muito usada para melhorar a experiência dos participantes. Por exemplo, aqui, no Congresso da APAVT, a IA está a ser utilizada para a tradução automática.
Estas máquinas são muito boas a sumarizar, a extrair e a produzir informação. E, por isso, na indústria dos eventos, em que precisamos de rapidamente ter voz a ser falada em tempo real e haver tradução em tempo real da mesma, é uma utilização óbvia de um caso de uso de grande impacto e benefício… Há aqui transformações, tal como nós tivemos anteriormente. Dou sempre o exemplo da banca, quando entraram os ATM a dar e a receber dinheiro e a passar papéis. Passamos as pessoas para tarefas de maior valor acrescentado, atendimento e venda de produtos mais complexos. A mesma coisa aqui. Eu acredito que os tradutores vão ser utilizados para fazer outras coisas. Não consigo dizer o quê, provavelmente as pessoas na indústria conseguem, mas a substituição aqui era óbvia. Estas máquinas são muito melhores e mais rápidas do que nós a fazer tradução em muito mais línguas. A HeyGen, no vídeo que mostrei dizia 40 línguas, mas eles acabaram de lançar [a possibilidade de] 175 línguas; por isso, nós conseguimos pôr estas máquinas a falar e a traduzir em tempo real 175 línguas.
Que ferramentas podem ser úteis para a indústria dos eventos?
Por exemplo, a HeyGen acho que é claramente uma; tem a possibilidade de criar avatares. Estive recentemente no evento estratégico da SONAE, onde um avatar fez a apresentação de todo o evento. Foi tudo produzido através de uma filmagem. Já agora, para fazer um avatar são dois minutos de filmagem; na realidade, é aí que treinamos o algoritmo para ele aprender como é que é a pessoa, a sua fisionomia, como é que ela se expressa, como é que fala, o tom de voz, e a partir daí passamos a ter um avatar que consegue repetir tudo aquilo que nós somos, apenas pela injeção do texto que queremos que ele leia.
Estamos a substituir o ser humano…
Acho que é nesta altura de hype. Eu não acredito que nós vamos substituir, porque o que faz a diferença é quando nós temos seres humanos a falar com seres humanos. Nesta altura, estamos a utilizar isto mais pelo hype, pelo impacto que tem de ser novidade. Por isso, não acredito, até porque não queremos. Há várias empresas agora que estão a falar em pôr avatares a irem às reuniões por nós. Eu não sei se iria a uma reunião em que alguém me diz que vai mandar o avatar para se reunir comigo. Por isso, acredito que continua a haver espaço para o ser humano. Os use cases que são importantes são as tarefas repetitivas, mundanas, que nós temos dificuldade em fazer de forma eficiente e que estas máquinas fazem melhor, e que, já agora, nos libertam do pavor e stress que nós não gostamos de fazer para fazer coisas que nos dão prazer.
Mas sendo o turismo e os eventos indústrias de pessoas para pessoas, não há aqui riscos associados?
O que estamos a viver é muito novo. Para dar uma perspetiva do que é que eu quero dizer com riscos, hoje, nós, que trabalhamos a desenvolver estas máquinas pensantes, já não compreendemos nem controlamos tudo o que elas fazem. Acho que é aqui que está o grande risco e daí ser muito importante termos proteções, barreiras e controlo para podermos ir dominando aquilo que estamos a criar. Agora, não podemos fazer com que isto seja um limitador da oportunidade enorme que existe para resolver grande parte dos grandes problemas que nós temos hoje no mundo e que nós, enquanto seres humanos, estamos com dificuldade em resolver. E estas máquinas têm essa capacidade, porque conseguem processar informação, sistematizá-la e produzir resultados em unidades e frações de tempo que para nós são anos, dezenas de anos ou mesmo centenas de anos e que eles vão conseguir fazer em minutos ou em segundos.
*A jornalista viajou a convite da APAVT
© Maria João Leite Redação
Jornalista